Decisão do STJ restringe Airbnb, mas é preciso um olhar condizente com as inovações

Decisão do STJ restringe Airbnb, mas é preciso um olhar condizente com as inovações

Às portas do verão, que movimenta o mercado imobiliário em muitas regiões do Brasil, o Superior Tribunal de Justiça definiu mais uma posição que desfavorece as plataformas de aluguel por temporada, em especial o Airbnb. De acordo com a 4ª Turma do STJ, o proprietário não pode alugar um imóvel por períodos curtos sem a autorização do condomínio. Ainda que a decisão seja um entrave aos que investem nesse tipo de negócio, traz um pouco de direcionamento a uma prática que ainda carece de muita regulamentação e que vem ocorrendo na insegurança jurídica. Mas o ideal é que as definições venham por meio de leis específicas.

A legislação brasileira ainda não se atualizou para acompanhar o ritmo do avanço e da adesão às plataformas digitais. Há pistas sobre rumos a serem tomados, contudo nem sempre no mesmo sentido.

A Lei de Locações (Lei 8.245/1991) considera que os aluguéis por temporada são aqueles que duram até 90 dias “destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo”. Logo, os condomínios poderiam restringir contratos ou utilização dos imóveis por períodos inferiores a 90 dias. E, segundo o artigo 1.351 do Código Civil, é preciso que dois terços dos condôminos aprovem alterações em qualquer sentido na convenção de condomínio.

Levando-se em conta o direito imobiliário, portanto, há parâmetros para se conduzir a questão. A jurisprudência também não é de agora. Em 2021 a 4ª Turma do STJ já havia proferido decisão em que considerou impossível a atividade de hospedagem remunerada quando a convenção de condomínio prevê que os imóveis têm destinação residencial. Vale pontuar contudo que, à época, o relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão, ficou vencido, com o argumento de que as locações por plataforma não se enquadram no conceito de hospedagem, mas de aluguel por curta temporada.

O fato é que a legislação não considerou essa modalidade de locação atrelada à tecnologia, que elevou o índice de locações a curto prazo. Em seu voto, Salomão citou precedente do Supremo Tribunal Federal em relação às atividades de transporte compartilhado como a Uber. E, em breve, a questão do Airbnb deve chegar à corte suprema, onde questões como liberdade econômica e função social do imóvel devem ser consideradas.

O ideal é que, além do Judiciário, os legisladores se debrucem sobre o assunto. Uma lei bem moldada aos novos tempos reduziria o índice de judicialização. É fundamental ouvir as distintas partes, considerar seus contextos.

Por um lado, há moradores preocupados com o alto índice de rotatividade e, consequentemente, a conservação e a segurança de seus condomínios. Por outro, há todo um mercado que se aquece visando essa possibilidade de locação por temporada via plataformas, que, não se pode negar, trouxe mais segurança e estabilidade a esse tipo negociação que sempre envolve desconfiança e risco para os dois lados, locador e locatário.

Uma lei bem detalhada poderia, por exemplo, definir períodos mínimos de locação, como um prazo de dez dias para condomínios focados em residência por longo prazo. Esse seria um índice razoável para que a rotatividade não seja tão intensa e para ao mesmo tempo viabilizar o investimento daqueles que apostam nesse tipo de locação.

Afinal, não se pode ignorar que o mercado imobiliário tem presenciado um considerável contingente de investidores que adquirem imóveis contando com a possibilidade de alugar por temporada via plataformas. Assim, as decisões sobre o tema impactam não apenas condôminos e a empresa líder de mercado, mas toda uma rede que passa pelo mercado da construção civil e das incorporações imobiliárias.

Ao se tratar desse tema é preciso não somente olhar para o retrovisor das normas e decisões baseadas em um mundo analógico, mas também mirar as inovações que se impõem e impactam as relações econômicas e sociais. É certo que não devemos ser reféns das tecnologias, mas é prudente que façamos delas o melhor uso para promover a legalidade e o avanço da economia.

é advogado e mestre em Direito pela PUC-SP.

 

Fonte: Conjur