Hoje venho trazer um dos assuntos mais comuns no dia a dia condominial e que, na maioria das vezes, vem parar em nosso escritório para resolução.
Certo dia, o corpo diretivo de um dos nossos condomínios assessorados pediu uma direção sobre como agir em face à uma unidade condominial porque foram registrados diversas reclamações acerca de barulhos advindos daquela unidade, cujos relatos referiam-se a altos ruídos de cachorro correndo e pulando pelo apartamento, vozes altas, gritarias e pessoas discutindo, bem como, foi constatado um acúmulo muito grande de pelo canino nos corredores, e todas estas alegações foram comprovadas através de reclamações no livro realizadas por mais de uma unidade condominial, bem como foram entregues ao síndico gravações dos barulhos e das vozes altas, fotos e filmagens da sujeira originada dos pelos caninos nos corredores.
No caso, o que acontecia naquela unidade condominial, não estava prejudicando apenas um vizinho de porta, mas sim, aconteceram reclamações de várias unidades daquele mesmo andar, o que descaracteriza um “problema entre vizinhos” passando a ser uma resolução que deveria ser buscada pelo condomínio, e como advogada consultiva deles, me ative ao Regimento Interno e à Convenção Condominial, além das normas vigentes no Código Civil e demais leis, para poder conduzir o caso.
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Relembro ainda que as reclamações foram devidamente comprovadas e que constatei por diversos meios de provas que a conduta estava causando demasiado incômodo aos demais condôminos, sem esquecer também que não era “apenas” uma questão de barulho, e sim, que a presença de pelos prejudicava não só a higiene do ambiente, como também, poderia ocasionar problemas alérgicos e respiratórios aos moradores.
Estudando e trazendo à conhecimento o Regimento Interno daquele condomínio, destaco que ficava claro na sua leitura que os condôminos deveriam manter a boa convivência, respeitando as regras constantes daquele regulamento, que dizia o seguinte:
ARTIGO 12º – Os animais […]
“Parágrafo Segundo: É vedado aos condôminos, moradores, seus familiares e empregados, possuir e manter no edifício animal, ave e/ou qualquer bicho de estimação, quais quer que sejam a sua espécie ou raça, que perturbem os demais comunheiros.”
“Parágrafo Oitavo: Não será permitida, nem tolerada, mesmo que sem finalidade de comércio, a criação de animais, aves e quaisquer outros bichos de qualquer espécie que, pela quantidade, ruído, odor e condições de higiene, interfiram no bem estar da vizinhança.”
“Parágrafo Décimo: Caso o animal, ave e/ou qualquer bicho de estimação provoque continuamente barulho, sujeira, mau cheiro e/ou outras formas de incômodo ao demais moradores ou ao condomínio deverá o seu possuidor providenciar a retirada imediata e definitiva do animal, ave etc. do condomínio.”
Ressalto ainda que naquele mesmo documento, havia um disposto no capítulo das PROIBIÇÕES DO INTERESSE COMUM, em específico um artigo, o de n. 28, que dispunha acerca do barulho nas unidades autônomas:
“ARTIGO 28 – Causar aglomeração, vozerio ou tumulto em qualquer parte do condomínio inclusive no interior das unidades autônomas.”
Mesmo sendo a norma interna do condomínio através do Regimento, demasiadamente clara, reiteirei todo o ali contido indo para o nosso Código Civil, que determina ainda:
“Art. 1.336 – São deveres do condômino:
[…] IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.”
Se você se interessou em ler este texto, provavelmente é da área condominial, talvez um advogado, um síndico ou até um condômino morador, e devem saber das funções de um regulamento interno dentro do condomínio, mas preciso ressaltar tais funções para que fique mais uma vez bem claras: as normas internas do condomínio são elaboradas com o intuito de preservar o convívio pacífico e o bem-estar entre os condôminos, garantindo, assim, o sossego entre todos os moradores, razão pela qual estas devem ser observadas e cumpridas por todos que ali residam, sem exceção.
O corpo diretivo daquele condomínio ficou em dúvida sobre como agir: apenas advertir ou já multar para que isso não ocorra novamente?
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Neste momento se faz imprescindível o estudo da Convenção Condominial, pois algumas trazem o trâmite das advertências e multas, ou seja, já descrevem como estas devem ser aplicadas, outras descrevem parte do trâmite, porém outras são omissas, dizendo apenas que o condômino que descumprir com as regras internas, será multado em X cotas condominiais, o que pode fazer-se entender que, poderá multar o condômino infrator diretamente, sem advertir anteriormente ou conceder um prazo para sua argumentação de defesa.
No caso deste condomínio, a convenção foi omissa, descrevendo apenas sobre a valoração da multa no caso de não cumprimento das regras internas, e apesar de comprovadas as infrações ao Código Civil e aos instrumentos normativos daquela edificação, eu sempre sugiro aos meus condomínios assessorados que privilegiem as garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório, de forma preliminar, antes da aplicação da penalidade de multa, para que a unidade infratora se manifeste em relação ao fato narrado e que, após, seus argumentos sejam colocados para apreciação do Corpo Diretivo, que poderá avaliar todo o cenário e decidir em retirar a advertência, mantê-la ou multar após sua apreciação.
Neste caso, fiz uma ADVERTÊNCIA escrita, considerando a gravidade da conduta, pedindo que o mesmo se manifestasse previamente e também por escrito, no prazo de dez dias em relação aos fatos narrados e que violam as normas internas e que, naquele caso, eram, por sua própria natureza, passíveis de penalidade pecuniária da cota condominial segundo a Convenção Condominial, deixando claro que seria automaticamente aplicada no caso de inércia do condômino em se manifestar, ou no caso do corpo diretivo negar todas as suas argumentações.
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Vale lembrar que, muitas vezes, um caso de multa direta é levada ao poder judiciário pelo condômino que se sentiu injustiçado, somente pelo fato de que não foi dada à ele a oportunidade de se defender e explicar os motivos da sua conduta; agindo desta forma, dando a oportunidade para o mesmo se defender antes de aplicar a penalidade, poderíamos evitar muitos destes processos sobre multas aplicadas de forma errônea e que são levados ao judiciário, e a grande maioria de processos que são julgados procedentes para o condômino e improcedentes para o condomínio, simplesmente porque não foi dada a prerrogativa de defesa para o mesmo antes da aplicação da penalidade de multa.
Neste caso, o corpo diretivo decidiu em permanecer com a advertência e no caso de reincidência, a unidade poderá ser multada diretamente; até o momento ainda não tive novas ocorrências desta unidade. Que assim permaneça!
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Amanda Accioli, Advogada formada em 1996, pós-graduada em Direito Empresarial (Mackenzie), em Direito Público (Federal Educação) e em Direito Imobiliário (Escola Paulista de Direito). Possui formação complementar na área condominial, como de Administração Condominial e Síndico Profissional, de Direito Condominial e de Direito Imobiliário, todos pela Escola Paulista de Direito (EPD), entre outros. Hoje realiza trabalhos como síndica profissional e presta consultoria para síndicos de condomínios residenciais e comerciais, bem como atua como advogada consultiva condominial para grandes escritórios jurídicos. Membro da Comissão de Direito Condominial da OAB/SP e membro da Comissão de Direito Urbanístico e de Vizinhança da OAB/SP – Subseção de Pinheiros.
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