A locação de imóveis por curta temporada por meio de plataformas digitais, como Airbnb e Booking, tem se popularizado rapidamente, oferecendo oportunidades de renda para proprietários e opções flexíveis para viajantes. No entanto, essa prática tem gerado conflitos em condomínios residenciais, levando a disputas judiciais sobre a legalidade da atividade diante das regras condominiais.
O STJ tem consolidado o entendimento de que condomínios podem restringir a locação de curta temporada quando há previsão na convenção condominial de destinação exclusivamente residencial e familiar. Esse entendimento baseia-se na preocupação com a segurança e a tranquilidade dos moradores, uma vez que a alta rotatividade de pessoas sem vínculo concreto com o condomínio pode comprometer o sossego e a confiabilidade do ambiente.
Além disso, o direito de propriedade não é absoluto e deve ser exercido de forma que respeite os interesses da coletividade. A destinação familiar prevista nas convenções condominiais tem sido considerada suficiente para impedir a exploração comercial dos imóveis por meio de plataformas digitais, visto que a entrada frequente de novos ocupantes pode trazer riscos à segurança, à salubridade e ao bem-estar dos demais moradores.
Locação por temporada x hospedagem: Qual a diferença?
Um dos principais pontos de debate é a diferenciação entre locação por temporada e hospedagem, conforme entendimento do STJ.
Locação por temporada (lei 8.245/91, art. 48): Caracteriza-se pela cessão do imóvel por prazo máximo de 90 dias, com a finalidade de residência temporária para o locatário.
Hospedagem (prática via Airbnb): Envolve cessão de espaços por períodos curtos, alta rotatividade de ocupantes e serviços adicionais, como limpeza e recepção, caracterizando uma atividade comercial atípica.
Os tribunais entendem que a alta rotatividade de pessoas e a ausência de vínculo entre os ocupantes e a comunidade condominial caracterizam a hospedagem, diferenciando-a da locação por temporada. Essa modalidade de uso pode comprometer a segurança e a harmonia do condomínio, levando à necessidade de restrições para garantir a qualidade de vida dos moradores.
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A decisão de autorizar ou não esse tipo de atividade deve ser tomada de forma clara, respeitando as normas internas do condomínio e garantindo que a exploração econômica dos imóveis não afete negativamente a coletividade.
O que isso significa para locadores?
Se a convenção do condomínio estabelece uma destinação exclusivamente residencial, o proprietário não poderá realizar locações de curta temporada via plataformas digitais, sob pena de sanções administrativas e até ações judiciais por descumprimento das normas internas.
Locadores devem estar cientes de que a prática de aluguel de curta temporada, mesmo quando não proibida explicitamente, pode ser questionada judicialmente caso comprometa a segurança e o sossego dos demais condôminos.
O papel das regras condominiais
O CC concede aos condomínios autonomia para regular o uso das unidades autônomas, desde que isso esteja devidamente disposto na convenção condominial. Os principais dispositivos aplicáveis são:
Art. 1.332: exige a definição da destinação do condomínio na convenção.
Art. 1.336, IV: impõe o dever de os condôminos respeitarem a destinação do imóvel.
Art. 1.351: estabelece a necessidade de aprovação de dois terços dos condôminos para mudanças na destinação do imóvel.
Se a convenção ou o regimento interno determinarem que o imóvel deve ser utilizado exclusivamente para fins residenciais e familiares, a locação de curtíssima temporada pode ser proibida, mesmo que não haja uma vedação expressa à prática via plataformas digitais.
Condomínios que desejam regular a locação por temporada devem promover assembleias para deliberar sobre a inclusão de cláusulas que expressem claramente a posição dos condôminos, garantindo segurança jurídica para todos os envolvidos.
Debates e argumentos atuais
A questão da locação por plataformas digitais tem gerado intensos debates no meio jurídico e imobiliário. De um lado, há argumentos favoráveis à liberação, sustentando que a exploração econômica dos imóveis faz parte do direito de propriedade. De outro, há aqueles que defendem a restrição, baseando-se no direito ao sossego, segurança e bem-estar dos moradores permanentes.
Os tribunais têm analisado a questão caso a caso, levando em consideração fatores como a finalidade do condomínio, os impactos na segurança e as disposições internas. Locadores devem estar atentos às decisões mais recentes para garantir que suas atividades estejam em conformidade com as normas vigentes.
Conclusão: A locação de imóveis por plataformas digitais exige um entendimento claro das regras condominiais e das decisões judiciais recentes. Para os proprietários, a adequação às normas internas do condomínio é essencial para evitar conflitos e perdas financeiras. Para os condomínios, o respaldo jurídico permite a aplicação de regras que garantam a segurança e a qualidade de vida dos moradores.
Antes de investir em locações de curta temporada, consulte a convenção do condomínio e busque orientação jurídica especializada para garantir uma operação segura e legal.
Werner Damásio: Advogado com 17 anos de experiência, pós-graduado em Direito Privado e especializado em Direito Cível e Empresarial. Sócio do escritório Lettieri Damásio Advogados, com atuação consolidada em Direito.
Fonte: Migalhas