Honorários contratuais e a responsabilidade por quem usa o judiciário de forma predatória, uma reflexão.

Recentemente um cliente procurou nosso escritório para informar que foi intimado como litisconsorte passivo numa ação de dano moral.

Como é de praxe nas formas como conduzimos as lides em nosso escritório, procuramos o autor para numa conversa mais franca, sem as amarras técnicas da petição inicial, tentar identificar a origem do conflito e resolver o problema através da autocomposição, sem a necessidade de litigar.

Qual foi a minha surpresa ao constatar que o autor informara que: – “o seu cliente foi demandado apenas para fazer parte da ação”, e ele ainda completou: – “é só vocês alegarem ilegitimidade passiva que o juiz tira”.

Ora, se o próprio demandante reconhece a ilegitimidade de nosso cliente então porque ele precisa se defender por algo que reconhecidamente não deu azo ?

Isto coube uma reflexão que passou pela seara da psique humana, pelas formas como somos educados, pela necessidade de tirar proveito de tudo, pelo “jeitinho brasileiro” onde por fim, chequei a conclusão de que eu não teria a competência multidisciplinar para chegar a uma resposta objetiva.

Talvez pela minha primeira formação na área técnica, em computação, procuro racionalizar e encontrar uma razão lógica para este tipo de comportamento, contudo, sem sucesso.

Sinceramente como mero espectador, já estou farto dessas ações temerárias, fico imaginando como se sentem os atores desta peça teatral: O juiz, os serventuários da justiça, os demandados, ou seja, toda engrenagem que funciona para por fim a algo que nem deveria ter começado. E o custo para movimentar todos os envolvidos ?  Ora, neste sentido o próprio Estado é vítima.

Sem entrar na discussão do princípio da inafastabilidade da jurisdição ou do Direito de ação que dispõem que: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, fico me questionando se não haveria formas objetivas de coibir esta prática, pois isto tem um custo e que é pago por todos nós, ou alternativamente se não coibir, punir, o que me parece a solução.

Ou seja, punir as pessoas que se utilizam do judiciário a fim de tentar enriquecer as custas de um terceiro, sem que estejam apoiados por argumento jurídicos sólidos, com o pensamento de quem sabe numa dessas aventuras uma das partes não contesta ou o faz de forma ineficiente, ocasionando ganho de causa ao autor aventureiro, em detrimento ao perdedor desassistido, mas não pelo mérito, mas por uma questão processual ou por falha técnica da outra parte.

Sendo assim, ao autor que arrisca nesse expediente deveria haver alguma pena em pecúnia a titulo pedagógico como forma de coibir e refletir a parte demandante sobre o risco do ingresso com uma ação temerária.

Neste sentido o Código Civil se prenunciou dispondo que cabe a parte que ingressou com a ação todo o risco que dela se despende, mas não é o que ocorre na pratica. Raras exceções o litigante de má fé é condenando, mas de forma geral qualquer aventureiro pode pleitear direito mesmo que não tenha, sem haver qualquer pena pela utilização predatória do judiciário.

Ora, o litigante de má-fé é aquele que busca vantagem fácil, alterando a verdade dos fatos com ânimo doloso.

Imagine a seguinte situação: Uma empresa de pequeno porte, com três funcionários, sem departamento jurídico, sem qualquer conhecimento técnico e que possui toda a sua estrutura concentrada no seu negocio se vê como parte num processo e precisa contratar um advogado.

Pois bem, o profissional é contratado, honorários contratuais pagos, a demanda por fim mostra-se improcedente e a empresa sai vitoriosa.

 

[adrotate group=”1″]

 

Ora, sob o aspecto econômico-financeira a empresa “perdeu”. Claro! Se a empresa contratou um advogado, pagou os honorários contratuais, mesmo sendo vitoriosa, ainda terá seu patrimônio diminuído, pois teve que dispender recursos se defendendo de uma ação temerária.

Entendo que a parte vitoriosa deveria ter de volta seu status quo original, ou seja, com a condenação da parte ao ressarcimento das despesas processuais que a outra teve, inclusive honorário contratuais.

Esta situação é prevista pela inteligência dos artigos 389, 395 e 404 do Código Civil.

Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Resolvida a questão da perda patrimonial da outra parte, cabe questionar, para o caso exposto acima, e a multa pedagógica pelo litigante de má-fé ?

Pois bem, os art. 81 e 338 do Novo CPC dispõem sobre esta situação:

Art. 81.  De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou.

Art. 338.  Alegando o réu, na contestação, ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição inicial para substituição do réu.

Parágrafo único.  Realizada a substituição, o autor reembolsará as despesas e pagará os honorários ao procurador do réu excluído, que serão fixados entre três e cinco por cento do valor da causa ou, sendo este irrisório, nos termos do art. 85, § 8o.

Os artigos foram bastante felizes, mas o que ocorre na prática, apesar de a multa ser frequente na Justiça, a indenização ainda é rara.

Neste sentido, existe uma luz no fim do túnel, pois recentemente, ao julgar recurso interposto por uma seguradora (REsp 1.134.725-MG), o Superior Tribunal de Justiça confirmou a responsabilidade daquele que deu causa à propositura da ação em arcar integralmente com os honorários contratuais do advogado da parte contrária, que se sagrou vencedora na ação.

Neste caso, a relatora ministra Nancy Andrighi, destacou que os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada e para que haja reparação integral do dano sofrido, aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais. Tal decisão ocorreu com a acertada fundamentação:

“O Código Civil de 2002 – nos termos dos arts. 389, 395 e 404 – determina, de forma expressa, que os honorários advocatícios integram os valores devidos a título de reparação por perdas e danos.

Os honorários mencionados pelos referidos artigos são os honorários contratuais, pois os sucumbenciais, por constituírem crédito autônomo do advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da demanda.

Assim, como os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada – para que haja reparação integral do dano sofrido – aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais”.

Outro julgamento seguiu o mesmo sentido: REsp 1.027.797/MG

“Os honorários convencionais integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos artigos 389, 395 e 404 do CC/02. 5. O pagamento dos honorários extrajudiciais como parcela integrante das perdas e danos também é devido pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas, diante da incidência dos princípios do acesso à justiça e da restituição integral dos danos e dos artigos 389, 395 e 404 do CC/02, que podem ser aplicados subsidiariamente no âmbito dos contratos trabalhistas, nos termos do artigo 8º, parágrafo único, da CLT. 6. Recurso especial ao qual se nega provido. (STJ – Resp 1.027.797 – Relª Minª Nancy Andrighi – DJ 23/02/2011)”

Este assunto é tão vasto que alguns doutrinadores estão escrevendo sobre “O uso predatório do Judiciário”. Ou seja, as grandes empresas e o próprio Estado, como eles já dispõem de departamentos e servidores, se utilizam desta máquina como forma de procrastinar o que são obrigações originárias.

A justiça do trabalho, na vanguarda, já conceituou este fenômeno de “Dano moral processual”.

Portanto, nobres juízes, desembargadores e ministros façam uso da condenação dos litigantes de má-fé, da condenação por fraude processual, da condenação por dano moral processual, pois isto seria medida pedagógica para evitar as famosas demandas temerárias que sobrecarregam o sistema desnecessariamente.

 

 

Por Rogério Camello: Advogado da Marvan Administradora de Bens e Condomínios; Sócio fundador da Alvares Camello & Otero Rocha Advogados Associados; Atuou como Síndico terceirizado durante 10 anos; Corretor de Seguros pela Funenseg; Pós-graduado em finanças pela UPE; Graduado em Informática pela AESO; Advogado formado pela Devry; Cursando Especialização em Direito Imobiliário; Palestrante; Membro da Comissão de Direito Imobiliário  e Registral e Notarial da OAB/PE; Membro do IBRADIM (Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário) na Comissão de Direito Condominial e Registral; Militante na área de Direito Imobiliário e trabalhista.

 

 

Leia mais artigos aqui!

 

LEIA TAMBÉM