Por Silvia Lobo Cavalcante*
A sociedade está começando a vivenciar a era da reputação e práticas que arranhem a imagem das empresas são capazes de destruí-las, muitas vezes sem espaço para sua recuperação.
Quem não ouviu falar nos escândalos envolvendo as empresas JBS, Siemens, Enron e Arthur Andersen, os quais arranharam ou até acabaram com a reputação das empresas por conta de escândalos envolvendo ética e corrupção?
As empresas que conseguem sobreviver a episódios desse tipo arcam com custos elevadíssimos em ações de compliance e marketing para ter sua imagem restabelecida.
Sendo assim, a ética nas relações corporativas é um atributo decisivo para o bom desempenho das empresas e sua respeitabilidade perante a sociedade e ações preventivas demandam investimentos drasticamente inferiores aos necessários quando os escândalos e prejuízos já ocorreram.
No mesmo sentido, para que um condomínio com gestão modernizada se mantenha na dianteira, ele deve atuar para ir além dos cuidados que já adota e buscar a atualização permanente de ferramentas que viabilizem um eficiente cumprimento da legislação civil, tributária, trabalhista, ambiental, além de normas técnicas e regulamentações específicas, como de obras, incêndio, acessibilidade entre outras.
Nesse contexto, não há como se afastar a importância da implantação de mecanismos de compliance no ambiente condominial, nas administradoras de condomínios e nas empresas prestadoras de serviços.
Compliance é o conjunto de mecanismos para fazer cumprir as normas legais e regulamentares estabelecidas para o negócio, objetivando evitar, detectar e tratar qualquer desvio ou inconformidade que possa ocorrer.
É um mecanismo de governança corporativa, servindo como ferramenta para uma gestão jurídica preventiva nas empresas.
Mas tal mecanismo, dada sua importância e eficiência, pode ser aplicado em diversos outros modelos de instituições, tais como em escolas, em condomínios e até em nossas próprias famílias.
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Então, falar em um condomínio compliant significa dizer que o condomínio está em conformidade com as normas que o regem e que, com isso, possui segurança jurídica, diminuindo o risco de ações administrativas e judiciais.
Além disso, a implantação de tal mecanismo em condomínios gera maior transparência e eficiência nos processos de contratações de produtos e serviços, favorece a redução de despesas e contribui para a disseminação da cultura da ética e da integridade no ambiente condominial.
Por seu turno, a implantação de um programa de compliance nas administradoras de condomínios impacta, além da prevenção contra os riscos éticos e jurídicos, na garantia da eficiência, na obtenção de um diferencial de mercado, bem como no combate a pagamentos indevidos a fornecedores, ao desvio de recursos e à redução dos lucros em geral.
Se diferenciar no mercado não é etapa fácil e, do ponto de vista econômico, as empresas que implementam programas de compliance obtêm um diferencial competitivo que deixa claro para seus stakeholders a sua preocupação com a satisfação do cliente, tendendo a serem vistas como organizações preocupadas em implementar padrões contínuos de melhorias nos aspectos ético, social e ambiental, o que fará toda a diferença quando um investidor ou cliente estiver em dúvidas sobre determinada empresa ou produto.
Ainda, para cercar o ambiente condominial de segurança jurídica, defende-se, também, a
implantação de programa de compliance nas empresas prestadoras de serviços e fornecedoras de produtos, garantindo-se, com isso, a sua integridade, o que também constitui diferencial de mercado, podendo ser considerado pré-requisito para a contratação, por parte de condomínios que desejem implementar programas mais rigorosos.
Tal medida já é adotada por inúmeros governos estaduais, que editaram leis específicas para determinar que somente irão realizar contratos administrativos com empresas que comprovarem terem implementado programas de compliance efetivos.
O Compliance Condominial envolve a construção de alguns pilares fundamentais.
Inicialmente, é requisito básico o engajamento total do síndico na implementação de regras e princípios éticos, íntegros e transparentes. É imperativa a mudança da cultura dos gestores e colaboradores, o que depende necessariamente do engajamento do síndico.
O segundo pilar é a criação de um Código de Ética e de Conduta Condominial, que consiste em um conjunto de regras, dirigido a todos os administradores, empregados e colaboradores, para orientar e disciplinar os padrões éticos aceitos e as condutas permitidas e proibidas no ambiente condominial.
Outro pilar fundamental é uma efetiva gestão dos riscos aos quais o condomínio está sujeito, o que pode envolver riscos de corrupção e éticos, riscos decorrentes da má contratação de bens e serviços, riscos de fraude e de violação de direitos, riscos de acidentes de trabalho etc.
Tal medida é a que mais contribui para a segurança jurídica condominial e, caso bem implementada e monitorada, previne despesas com ações emergenciais e judiciais.
Para se falar em um condomínio compliant, também deve-se garantir que o condomínio esteja em conformidade com sua própria Convenção e com seu Regimento Interno.
Algumas situações comuns de não conformidades encontradas na análise de Convenções são a falta de aprovação de despesas extraordinárias pelo Conselho e a falta de arrecadação ou utilização indevida do Fundo de Reserva.
Em relação ao Regimento Interno, existem duas situações principais que contribuem para a falta de conformidade do condomínio, quais sejam: i) a relutância do síndico em aplicar multas; e ii) a falta de divulgação constante sobre as normas do RI.
O mesmo deve ser feito em relação ao cumprimento das leis e obrigações que incidem sobre o condomínio, podendo o síndico se utilizar de um mapa de obrigações consolidadas, a ser constantemente monitorado, o qual deve ser apresentado junto com a prestação de contas do condomínio.
Finalmente, um importantíssimo pilar para o Compliance Condominial é a criação de uma Política de Contratação de Terceiros.
A cultura do compliance exige que, ao se contratar um terceiro, seja realizado o procedimento de know your partner (conheça seu parceiro), efetuando-se verificações para evitar desvios de conduta, tais como consulta à Certidão Negativa na Receita Federal e à lista das Empresa Inidôneas da Controladoria-Geral da União.
Entende-se que a implementação de tais medidas, além de trazer boa reputação ao síndico, ao síndico profissional e à administradora de condomínios, possui como principal benefício a disseminação da cultura do Compliance para todos os moradores, funcionários e prestadores de serviços do condomínio, colaborando, com isso, com a elevação da ética e da integridade em nossa sociedade.
*Advogada especialista em Compliance, proprietária do escritório Lobo Cavalcante Advocacia, Pósgraduada em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Estácio de Sá – Unesa, em Direito Ambiental pela Universidade de Brasília – UNB e em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV, Diretora da Comissão de Assuntos Regulatórios da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Distrito Federal – OAB-DF, Diretora de Relações Institucionais e Compliance do Instituto Nacional de Direito Condominial – INADCON, membro do Comitê de Compliance da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT, membro da Associação Brasileira de Advogados – ABA e membro da Associação Brasileira de Advogadas – ABRA.
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