Novidades da Lei nº 13.465/2017

Artigo de Carlos Eduardo Elias de Oliveira sobre as novas modalidades de condomínio instituídas pela Lei 13.465/2017.

Consultor Legislativo do Senado Federal na área de Direito Civil, Processo Civil e Direito Agrário (único aprovado no concurso de 2012). Advogado. Professor de Direito Civil (IDP-Brasília). Mestre em Direito (UnB). Bacharel em Direito na UnB (1º lugar no vestibular de 2002). E-mail: [email protected] . Facebook: nome completo.

 

 

  1. INTRODUÇÃO:
  2. Tivemos a oportunidade de, em outro texto[3], tratar do Direito Real de Laje, expondo-lhe as novidades e as suas principais características nos moldes da Lei nº 13.465/2017.
  3. Há, porém, outras inovações trazidas pela Lei nº 13.465/2016 que merecem ser tratadas por representarem novidades expressivas no Direito Civil.
  4. Vamos cuidar aqui de duas novas espécies de Condomínio (o de Lotes e o Urbano Simples) e de uma nova espécie de loteamento (o de Acesso Controlado).
  5. Deixaremos de abordar outras novidades, como a criação de um sistema destinado a operacionalizar o registro eletrônico de imóveis (art. 76), a instituição de um número único de matrículas imobiliárias no País (art. 101, que acresce o art. 235-A à Lei de Registros Públicos), a pulverização do registro das linhas férreas para cada uma das serventias de registros de imóveis sobre o trecho do tapete de trilhos inserido na sua circunscrição territorial (art. 56, que modificou o art. 171da Lei de Registros Públicos), a racionalização das regras de execução extrajudicial da propriedade fiduciária sobre imóveis (arts. 66 e 67, que, entre outras normas, modificou a Lei nº 9.514/97), as adaptações das regras de usucapião coletivo urbano (art. 79, que modifica o art. 10 do Estatuto da Cidade), a regulamentação de um procedimento de regularização fundiária urbana que permita a perda da propriedade de um imóvel que esteja ocupado, de modo consolidado, por terceiros diante do silêncio do titular tabular (arts. 20, § 6º, e 31, § 6º), a redução dos juros compensatórios nas desapropriações agrárias de 12% ao ano para o patamar remuneratório próprio dos Títulos da Dívida Agrária no caso de desapropriação por interesse social (art. , que insere o § 9º ao art.  da Lei nº 8.629/1993) e a possibilidade de levantamento de valores depositados em juízo na desapropriação após concordância escrita do desapropriado, sem renúncia ao direito de discutir diferenças de valores (art. 104, que acresceu o art. 34-A ao Decreto-Lei nº 3.365/1941).

 

  1. ESPÉCIES DE CONDOMÍNIO:

2.1. Noções gerais:

  1. Quando um bem pertence a mais de uma pessoa, ou seja, quando duas ou mais pessoas têm o domínio de um mesmo bem, tem-se um condomínio. Até a Lei nº 13.465/2017, o Direito Civil conhecia apenas duas espécies de condomínio: (1) o tradicional, também chamado de geral, disciplinado a partir do art. 1.314do CC e (2) o edilício, que é disciplinado a partir do art. 1.331 do CC e, no que não for contraditório, pela Lei nº 4.591/64.
  2. Com a Lei nº 13.465/2017, surgiram duas novas espécies de condomínio: (1) o condomínio de lotes, que está hospedado no art. 1.358-A do CC e credenciado também pelo art. 2º, § 7º, e pelo art. , § 4º, da Lei nº 6.766/79; e (2) o condomínio urbano simples, disciplinado pelos arts. 6163 da Lei nº 13.465/2017.
  3. O condomínio de lotes é fruto do que designamos de um parcelamento do solo que ora designamos de loteamento condominial, conforme exporemos mais abaixo.

 

2.2. Condomínio tradicional:

  1. Historicamente, a primeira espécie de condomínio que surgiu foi o condomínio tradicional ou geral, assim entendido o condomínio de frações ideais sobre um mesmo bem. Sob a concepção romana de condomínio – a qual prevaleceu no Direito brasileiro para efeitos de Direito das Coisas[4]–, cada condômino é dono de um “percentual” (uma fração ideal) do imóvel. Essa fração ideal tem conteúdo econômico e pode ser considerado um bem, suscetível, inclusive, de alienação.
  2. No direito brasileiro, o condômino pode alienar a fração ideal a terceiros, desde que, previamente, dê preferência para os outros condôminos (arts. 5041.314CC). Esse direito de preferência decorre da inclinação legislativa no sentido de estimular o retorno da propriedade ao seu perfil unitário, pois o condomínio tradicional é, na expressão dos romanos antigos, a “mãe da discórdia”. De fato, como expusemos no texto relativo ao Direito Real de Laje[5], a diversidade de projeto de vida de cada um dos condôminos sempre é um tonel cheio de pólvora cujo ansioso pavio está à espera de ser acendido por uma faísca de um pequeno desentendimento.

 

2.3. Condomínio edilício:

  1. Os avanços nas formas de construção fizeram com que surgisse a necessidade de disciplinar a relação jurídica que surgiu em arranjos de construção que envolviam, de um lado, recintos dedicados a apenas um dos condôminos e, de outro lado, áreas destinadas ao uso comum, à semelhança do que sucede nos prédios de apartamentos que conhecemos atualmente. O condomínio edilício passou a disciplinar essa organização arquitetônico-jurídica consistente em imóveis com áreas de propriedade exclusiva dos condôminos (“unidades autônomas”) – como os apartamentos em prédios – e áreas de propriedade comum – como o hall de entrada, a piscina etc.
  2. Nessa espécie de condomínio, cada condômino possui a propriedade exclusiva da unidade privativa, que, por representar um imóvel autônomo, recebe uma matrícula própria no Cartório de Imóveis. Lembre-se de que, à luz do princípio da unitariedade ou unicidade matricial, cada imóvel necessariamente deve ter uma matrícula no Cartório de Imóveis.
  3. Além de ser proprietário da unidade privativa, o condômino será titular de uma fração ideal do solo e das áreas comuns. A extensão da fração ideal dependerá do disposto no ato de instituição do condomínio, mas, na prática, o comum é que seja proporcional à dimensão da área construída da unidade privativa (art. 1.331§ 3º, do CC). Assim, quem é proprietário de um apartamento de 120 m2 terá uma fração ideal correspondente ao dobro do que teria o dono de um apartamento de 60 m2. Outros critérios poderiam ser adotados no ato de instituição do condomínio.
  4. Alerte-se que essa vinculação da unidade privativa a uma fração ideal da solo e das áreas comuns constitui uma situação jurídica propter rem. Isso significa que essa situação jurídica não depende da pessoa que seja a proprietário do bem, e sim apenas da própria existência do bem. Em outras palavras, quem adquirir a propriedade da unidade privativa necessariamente adquire a propriedade da respectiva fração ideal do solo e das áreas comuns.
  5. O condomínio edilício pode ser horizontal ou vertical. Embora haja certa controvérsia nessa classificação, parece-nos que a concepção de Caio Mário da Silva Pereira é a mais adequada. O condomínio horizontal é aquele em que as unidades autônomas são separadas por planos virtuais horizontais, razão por que também pode ser chamada de condomínio em planos horizontais. Isso significa que os famosos condomínios em prédios de apartamentos de vários andares representam um condomínio horizontal, pois os andares são separados por planos virtuais horizontais. Por outro lado, o condomínio vertical ou em planos verticais é aquele cujas unidades privativas são separadas por planos virtuais verticais. Trata-se dos famosos condomínios de casas.
  6. A propósito, o art. da Lei nº 4.591/64 define o condomínio horizontal (de andares) na alínea b e o vertical (de casas) na alínea a, conforme se lê abaixo:

Art. 8º Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte:

  1. a) em relação às unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquela eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades;
  2. b) em relação às unidades autônomas que constituírem edifícios de dois ou mais pavimentos, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação, aquela que eventualmente fôr reservada como de utilização exclusiva, correspondente às unidades do edifício, e ainda a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá a cada uma das unidades”
  3. Há, porém, quem se valha da classificação em sentido oposto ao de Caio Mário, associando a direção da construção à nomenclatura, de modo que o condomínio de andares seria vertical e o condomínio de casas seria horizontal.
  4. Seja como for, o fato é que o desenvolvimento histórico exigiu uma reformulação do conceito de propriedade para abranger um novo arranjo jurídico-real consistente no condomínio edilício.

 

2.4. Realidade a exigir novas espécies de condomínio diante do fenômeno do loteamento Fechado:

  1. O Direito nasce dos fatos, diziam os romanos (ex facto oritur ius). A realidade fática é que impulsiona o Direito. E, para lembrar o jurista francês George Ripert, “quando o Direito ignora a realidade, a realidade se vinga, ignorando o Direito”. A sabedoria popular não é diferente quanto à inevitabilidade de alguns fatos concretos diante da omissão do Direito e está expressa até em músicas, como neste excerto da música “O que será (a flor da terra)”, de Chico Buarque:

O que será que será?

Que todos os avisos não vão evitar?

Porque todos os risos vão desafiar.

  1. Evidentemente não estamos a celebrar a anomia ou o descalabro do Direito, mas apenas realçando que as normas jurídicas sempre devem buscar atentar para a realidade concreta. É papel do Direito também combater injustiças que eventual desordem fática esteja perpetrando. Em questões fundiárias, por exemplo, há situações em que o Direito deve sim valer-se da força para impedir esbulhos e invasões injustas. O tema, porém, é complexo e fica aqui expedido para outros debates acadêmicos.
  2. No presente momento, o que se quer realçar é que a realidade das cidades brasileiras passou a progressivamente ser ocupada por figuras conhecidas como “loteamento fechado”, mesmo sem um respaldo legal expresso. A realidade ignorou o Direito.
  3. Em suma, quando se trata de parcelamento do solo, a disciplina da matéria se dá por legislação própria. No Brasil, o primeiro diploma sobre loteamento foi o Decreto-Lei nº 58/1937. Depois, sobreveio o Decreto-Lei nº 271, de 1967, e, em seguida, a Lei nº 6.766/1979 (Lei de Loteamentos), as quais passaram a cuidar do parcelamento do solo urbano, de maneira que sobrou àquele primeiro diploma da era varguista a tarefa de disciplinar o parcelamento do solo rural no que não for incompatível com legislações rurais específicas.
  4. Grosso modo, o parcelamento do solo consiste na divisão de uma gleba (porção grande de terra) em lotes (porções menores de terra). É fatiar o solo em lotes. Quando se aproveita o sistema viário existente, o parcelamento do solo é batizado de desmembramento. Quando, porém, se criam vias de circulação, o parcelamento é designado de loteamento (art. , Lei nº 6.766/1979).
  5. O âmago da Lei de Loteamentos consiste no interesse público existente em o Estado controlar esses fatiamentos do solo, pois o parcelamento do solo pode implicar diversas repercussões negativas para a sociedade.
  6. Daí decorre que, por exemplo, a Lei de Loteamentos veda criação de lotes em tamanho inferior à fração mínima de parcelamento (art. 4º, II), a fim de evitar imóveis sem adequado potencial de aproveitamento.
  7. Igualmente, como o parcelamento do solo acarreta adensamento populacional, o que inevitavelmente gerará sobrecarga nos serviços públicos disponibilizados nas suas adjacências, a realização de loteamentos exige prévia autorização do município, em procedimento disciplinado pela Lei de Loteamentos. Nesse caso, o município poderá condicionar a aprovação a que o loteador ceda espaços para a construção de equipamentos públicos (ex.: para a instalação de uma escola pública) e a que o loteador custeie algumas obras públicas (ex.: expansão de asfalto). A propósito desse tema, fazemos remissão aos arts. ao 24 da Lei nº 6.766/79.
  8. Outra característica essencial da Lei de Loteamentos é estabelecer que, no momento do registro do loteamento no Cartório de Imóveis, imediatamente são transferidas para a propriedade do Município todas as áreas destinadas ao uso público, como as praças, as ruas etc. (art. 22, Lei nº 6.766/79).
  9. Como se vê, até o advento da Lei nº 13.465/2017, ao ser realizado o parcelamento do solo, não poderia haver a criação de áreas de propriedade comum dos proprietários dos lotes, ao contrário do que sucede quando se tem um condomínio edilício. Os proprietários dos lotes não são donos das ruas, das praças, das calçadas etc. O parcelamento do solo distinguia-se, portanto, do condomínio edilício vertical (o de casas) nesse aspecto.
  10. Daí decorre que, em princípio, se não houver consentimento municipal, as ruas não poderiam ser bloqueadas a terceiros. Isso significa que, se não houver um ato administrativo autorizando a instalação de portarias ou de cancelas para restringir ou controlar o trânsito de veículos e de pessoas pelas ruas e pelas calçadas da região loteada, essa prática era ilegal. Afinal de contas, a circulação pelas ruas e pelas calçadas a qualquer pessoa é essencial para a dinâmica da própria cidade por permitir a livre circulação. As cidades não podem ser compostas por vários “feudos murados” que dificultem o trânsito de veículos e de pessoas.
  11. A realidade, porém, sob o silêncio do Estado, caminhou no sentido da multiplicação de “loteamentos fechados”, que o linguajar popular costuma chamar de “condomínios fechados” (de modo atécnico – ao menos até o advento da Lei nº 13.465/2017). Os titulares dos lotes costumam constituir uma associação que se encarrega de murar a região parcelada e de instalar uma portaria para controle de acesso de pessoas e de veículos. Essa é uma realidade notória no País.
  12. Esse “loteamento fechado” seria legal se houvesse um ato administrativo concedendo o uso dos bens públicos (ruas, praças etc.) à associação de moradores, mas, na maior parte dos casos concretos, não há essa autorização.
  13. Ademais, como forma de burlar a Lei de Loteamentos, sempre foi comum os “loteadores” tentarem conseguir instalar um “loteamento fechado” invocando a figura do condomínio vertical (o de casas), previsto no art. da Lei nº 4.591/64. O argumento deles é o de que, sob essa formatação jurídica, as ruas, praças e demais áreas de uso comum não seriam transferidas à propriedade do Município – como sucede no loteamento tradicional –, mas seriam propriedade comum dos titulares das unidades privativas. E, nesse caso, não haveria a necessidade de criar uma associação de moradores, pois a administração da coisa comum incumbiria ao condomínio, ente despersonalizado que tem legitimidade para cobrar contribuições dos condôminos e administrar a estrutura predial.
  14. Realmente, a linha conceitual divisória entre o condomínio de casas e o parcelamento do solo não é nítida no texto da legislação. A distinção entre os institutos deve ser buscada na sua finalidade. O entendimento majoritário é no sentido de que, se o rearranjo espacial acarretar um considerável adensamento populacional, esse caso seria sujeito à Lei de Loteamentos, pois, além de ser necessário o controle prévio do Estado diante dos impactos que haverá nos serviços públicos, está claro que o objetivo aí é criar áreas com total autonomia para construção e administração.
  15. Se, porém, o adensamento populacional decorrente desse rearranjo espacial for pequeno, poder-se-ia cogitar no condomínio edilício vertical, caso o objetivo seja manter um convívio comum dos proprietários.
  16. O fato é que a linha conceitual divisória entre essas figuras realmente não é clara no texto da legislação, o que fez com que, em diversos casos, a figura do “loteamento fechado” recebesse ares de juridicidade por meio da utilização indevida das regras do condomínio horizontal (de casas). Houve até mesmo a edição de leis municipais autorizando esse tipo de solução jurídica precária.
  17. A discussão ganha mais relevância quando se pretende exigir que os proprietários dos lotes contribuam com as despesas comuns. O Superior Tribunal de Justiça golpeou letalmente muitos “loteamentos fechados” quando, mudando a sua orientação jurisprudencial, pacificou o entendimento de que não há obrigação de os titulares dos lotes pagarem qualquer contribuição para a associação de moradores. O STJ entendeu que não se poderia falar aí em enriquecimento sem causa, pois, no loteamento, as vias públicas e os demais equipamentos públicos são bens públicos municipais, de sorte que, por falta de obrigação legal, não há dever de contribuição compulsória pelos titulares dos lotes. Esse entendimento do STJ não abrangeu, porém, os casos de “loteamentos fechados” que foram disfarçados sob as vestes de condomínio “de casas” (STJ, REsp 1439163/SP, 2ª Seção, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Buzzi, DJe 22/05/2015).
  18. Tudo isso já denunciava o envelhecimento das figuras jurídicas disponíveis no Direito das Coisas para disciplinar a realidade. A situação de informalidade a que estão expostos inúmeros “loteamentos fechados” não decorre apenas da leniência do Estado, mas também (e principalmente) da morosidade legislativa no trato da matéria.

 

  1. Condomínio de lotes e o Loteamento de acesso controlado:

3.1. Definições:

  1. Com olhos na impotência jurídica tradicional para enfrentar a realidade de informalidade generalizada representada pelos “loteamentos fechados”, a Lei nº 13.465/2017 criou uma nova espécie de condomínio, batizado de “condomínio de lotes”.
  2. As regras centrais dessa nova espécie de condomínio foram colocadas, com acerto, no Código Civilao lado das outras figuras de condomínio. O Código Civil não precisou ser abundante em regras, pois, na realidade, esse condomínio de lotes, nada mais é do um desdobramento do condomínio edilício vertical (o de casas) de que tratava o art. 8º da Lei nº 4.591/2017. O Código Civil disciplina a matéria em apenas um artigo, o art. 1.358-A.
  3. Lembre-se de que condomínio edilício vertical (o de casas) não cria lotes, e sim unidades imobiliárias vinculadas a uma fração ideal do solo e das áreas comuns. Essas unidades autônomas consistem necessariamente em construções existentes, e não em meros lotes avulsos. Observe-se que a alínea a do art. da Lei nº 4.591/64 estabelece que o condomínio edilício vertical envolve “unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas”.
  4. Agora, o novo art. 1.358-A do CC passa a permitir a criação de um condomínio que será composto por lotes, os quais estarão necessariamente vinculados a uma fração ideal das áreas comuns em proporção a ser definida no ato de instituição. Isso significa que, nesse arranjo espacial, as ruas, as praças e as demais áreas de uso comum não são transferidas à propriedade do Município, mas continuam sendo propriedade privada, pertencente aos titulares do lote de acordo com a respectiva fração ideal.

 

3.2. Distinção em relação ao condomínio edilício em planos verticais:

  1. Diante da semelhança das figuras, o § 2º do art. 1.358-A do CC limita-se a estabelecer que serão aplicadas ao condomínio de lotes as regras de condomínio edilício no que couber. Apenas por questão meramente de conforto político, esse dispositivo afirma o óbvio: deve ser respeitada a legislação urbanística. Trata-se de obviedade, pois todos os condomínios têm de observar a legislação urbanística, assim como a ambiental e as de outras naturezas. Esse acréscimo destinou-se mais a dar conforto político na criação do instituto, com o objetivo de deixar clara a preocupação com as normas urbanísticas.
  2. Desse modo, no condomínio de lotes, não haverá uma associação de moradores, e sim um condomínio, ente despersonalizado que é representado pelo síndico, que se sujeita às deliberações dos condôminos e que tem legitimidade para cobrar as contribuições de todos os condôminos.

 

3.3. Obras de infraestrutura:

  1. Em excesso legislativo, o § 3º do art. 1.358-A estabelece que, “para fins de incorporação imobiliária, a implantação de toda a infraestrutura ficará a cargo do empreendedor”. Esse dispositivo afirma o óbvio: como, no condomínio de lotes, as áreas de uso comum são bens privados, não há razão alguma para que as obras de infraestrutura sejam feitas pelo poder público.
  2. Esse dispositivo, porém, é potencialmente causador de problemas jurídicos futuros, pois é plenamente possível entender que, na realidade, ele se destina a proteger os adquirentes de “lotes na planta” (incorporação é vender “imóveis futuros” que serão incorporados ao solo), de maneira que eventual cláusula dos contratos de alienação feitas pelo incorporador poderá ser tida por nula se deixar as obras de infraestrutura para serem executadas pelos compradores dos lotes.
  3. Ao nosso sentir, o dispositivo deve ser interpretado restritivamente, de modo a entender que, na realidade, ele se destina apenas a proteger o interesse público de que o condomínio de lotes não crie uma área desértica e sem o suporte adequado. Daí decorre que esse dispositivo não impede o incorporador de repassar os custos ou a obrigação de fazer essas obras aos compradores dos lotes. Esse repasse, porém, não exonerará o incorporador de responder perante a Administração Pública por omissões na realização dessas obras, ressalvado – se for o caso – o direito de regresso contra os compradores dos lotes.

 

3.4. Restrições próprias de condomínio: de fachadas a regras de convívio:

  1. 46. No condomínio de lotes, como as áreas comuns são propriedade privada, é viável que, na convenção condominial, sejam impostas restrições relacionadas à aparência do local e às regras de convívio.
  2. 47. Isso significa que, na convenção, poder-se-á estabelecer, por exemplo, que nenhuma casa poderá ter fachada de cor azul. Esse tipo de restrição destinada a manter um padrão de beleza é comum em “loteamentos fechados” nos EUA e, ao nosso sentir, revela-se plenamente compatível com o regime desenhado pelo condomínio edilício no Brasil.
  3. 48. É evidente que abusos de direito na convenção devem ser tidos por nulos. Assim, se a convenção proíbe que os condôminos hospedem crianças e até mesmo animais de estimação, estaremos diante de regras que excedem os limites da boa-fé, dos bons costumes e dos fins sociais e econômicos do direito, a configurar um abuso de direito e a atrair a nulidade da cláusula convencional (arts. 166187do CC).

 

 

 

3.5. Incorporação ou loteamento?

  1. 49. O condomínio de lotes deverá ser fruto de um parcelamento do solo. Afinal de contas, é um condomínio de … lotes! O próprio art. , § 7º, da Lei nº 766/1979 estabelece que o lote poderá ser constituído como um imóvel autônomo (que é a forma tradicional de lote até hoje conhecida) ou como uma unidade imobiliária integrante de um condomínio de lotes.
  2. O lote continua sendo um imóvel próprio, com direito a uma matrícula própria no Cartório de Imóveis, em observância ao princípio da unitariedade matricial. Todavia, o conceito de lote se ampliou.
  3. Isso significa que, para a criação de um condomínio de lotes, necessariamente devem ser observados todos os procedimentos da Lei de Loteamentos, como a exigência de aprovação prévia do município.
  4. A Lei nº 6.766/79, portanto, é plenamente aplicável para disciplinar também o condomínio de lotes. Ora, essa lei já possui regras para disciplinar os casos de venda de “lotes na planta”, ou seja, de lotes que ainda serão edificados, razão por que podemos levantar a seguinte indagação: a Lei de Incorporação Imobiliária (Lei nº 4.591/64) também seria aplicável?
  5. Incorporação imobiliária é alienar unidades autônomas de um condomínio que ainda será construído e instituído. É, grosso modo, alienar “imóvel na planta”. Portanto, se alguém haverá de construir um prédio e instituir um condomínio edilício sem alienar precocemente qualquer uma das unidades, não há falar em incorporação imobiliária.
  6. Ao nosso sentir, a Lei de Incorporação Imobiliária é vocacionada a preparar a instituição de condomínios no futuro, de modo que ela tem de ser também observada no condomínio de lotes. Nesse sentido, o próprio § 3º do art. 1.358-A do CC fez remissão expressa à incorporação imobiliária.
  7. Seja como for, entendemos que a Lei nº 4.591/64 deve ser aplicada para suprir lacunas da Lei de Loteamentos. Em outras palavras, a sua aplicação deve ser subsidiária. Por exemplo, a Lei de Incorporação prevê o “patrimônio de afetação” no seu art. 31-A como um modo de proteção aos adquirentes de futuras unidades autônomas, figura essa que deve ser admitida para suprir lacunas da Lei de Loteamentos. Igualmente, ao tratar dos documentos obrigatórios a serem apresentados pelo incorporador, o art. 32da Lei nº 4.591/64 lista documentos não previstos no catálogo de documentos a serem apresentados pelo loteador na forma do art. 18 da Lei de Loteamentos, a exemplo da “futura Convenção de condomínio que regerá a edificação ou o conjunto de edificações” (alínea j do art. 32 da Lei nª 6.766/79). Convém que a Lei de Incorporação supra essa lacuna da Lei de Loteamentos.
  8. Consideramos que a Lei de Loteamentos é o diploma principal a ser levado em conta, pois ela hospeda o interesse público vinculado à ordenação do território, interesse esse que justifica a prevalência dessa lei sobre a lei de incorporação imobiliária, cuja tônica repousa mais no interesse transindividual dos futuros proprietários de unidades autônomas do que propriamente em um interesse público mais puro. É verdade que a Lei de Incorporação também contém regras de interesse puramente público, mas elas representam um ingrediente menos concentrado do que sucede na Lei de Loteamentos.
  9. Portanto, diante do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, temos que a Lei de Loteamentos deve prevalecer no caso de divergência em relação à Lei de Incorporação Imobiliária, que servirá apenas para suprir lacunas daquela. O próprio legislador acenou para essa natureza principal da Lei de Loteamentos ao inserir ajustes apenas no texto desse diploma, e não no da Lei de Incorporação Imobiliária.

 

3.6. Restrições sobre áreas comuns dos Condomínios de lotes:

  1. A Lei de Loteamentos, como se realçou, disciplina o condomínio de lotes. Há, porém, adaptações, pois não se poderá aplicar a regra do art. 22 da Lei de Loteamentos, que prevê a transferência, para o patrimônio do Município, das áreas comuns. Afinal de contas, trata-se de áreas privadas.
  2. Todavia, embora esteja a afirmar o óbvio, a Lei nº 13.465/2017 foi didática ao inserir um § 4º do art. da Lei nº 6.766/79, estabelecendo que o município poderá instituir limitações administrativas ou direitos reais sobre essa área privada em benefício do interesse público. O referido dispositivo, no seu afã didático, deu exemplos, como a possibilidade de instituição de servidão de passagem, direito real de usufruto ou a imposição de restrições à construção de muros.
  3. As expressões “limitações administrativas” e “direitos reais sobre coisa alheia” devem ser interpretadas extensivamente, de modo a abranger também situações em que o Município impõe condições, termos e encargos. Afinal de contas, esses elementos influem na configuração do direito real. Dessa forma, é plenamente admissível que o Município condicione o parcelamento do solo a que o condomínio de lotes cumpra um encargo: a de construir um prédio para a instalação de uma escola pública às custas do próprio loteador. Trata-se aí de um encargo de interesse coletivo, que poderá ser exigido pelo Município e, também, por interpretação analógica do parágrafo únicodo art. 553 do CC, pelo Ministério Público.
  4. Nesse contexto, se não tiver havido imposição expressa do Município no momento de aprovação do loteamento ou se não houver outra norma municipal em sentido contrário, a construção de muros e o controle de acesso de veículos e de pessoas é plenamente admissível, pois as áreas comuns são propriedade privada.

 

3.7. O loteamento de acesso controlado:

  1. Embora o “loteamento fechado” possa ser plenamente constituído sob a forma de condomínio de lotes, nada impede que essa figura seja feita sem a constituiçãode um condomínio de lotes. É que a Lei nº 13.465/2017 adicionou o § 8º ao art.  da Lei nº 6.766/79 para criar a figura do “loteamento de acesso controlado”, que pode ser utilizada para respaldar a dinâmica de loteamentos fechados, assim entendidos aqueles que, por qualquer meio (muros, portarias etc.) restringem o acesso de terceiros à região loteada.
  2. O loteamento de acesso controlado nada mais é do que um parcelamento de que resultem lotes sob a forma de imóveis autônomos (e não como unidades condominiais) com a possibilidade de serem instaladas portarias nas ruas com o objetivo de controlar o acesso de veículos e de pessoas. Esse tipo de restrição de controle depende de ato administrativo do Município.
  3. Essa autorização municipal deverá ser concedida a algum representante dos interesses dos moradores da região loteada, o que geralmente sucederá em favor de alguma associação de moradores. Cumprirá ao Município regulamentar esse procedimento de seleção do representante dos moradores, mas é certo que uma associação que reúna parcela substancial dos moradores deve ser admitida como legitimada a receber a autorização municipal para promover o controle de acesso.
  4. O que o art. , § 8º, da Lei nº 6.766/79 deixou claro é que jamais poderá ser bloqueado o acesso de veículo algum ou de pessoa alguma, se o condutor ou o pedestre se identificar e autorizar o seu cadastramento. Há o interesse público de impedir a feudalização das cidades e o atordoamento do fluxo de veículos e de pessoas por conta de bloqueios indevidos à circulação em vias públicas.
  5. Lembre-se de que, no loteamento de acesso controlado, as vias de circulação são bens públicos municipais, o que justifica o direito de qualquer pessoa devidamente identificada circular através delas.
  6. Não se pode, portanto, confundir essa espécie de loteamento (o loteamento de acesso controlado) com o loteamento em regime de condomínio de lotes, pois, neste último, as vias de circulação interna são bens privados e, portanto, estão sujeitos a qualquer tipo de restrição imposta pelos condôminos, salvo limitação ou direito real impostos pelo município.

 

3.8. Espécies de loteamentos: tradicional, de acesso controlado e condominial:

  1. Em resumo, consideramos haver três espécies de loteamentos:
  2. a) Loteamento tradicional: aquele em que os lotes são imóveis autônomos (art. , § 7º, Lei nº 766/79).
  3. b) Loteamento de acesso controlado: é o loteamento tradicional com a autorização municipal para que os representantes dos proprietários (geralmente uma associação) controlem o acesso de pessoas e de veículos mediante a sua identificação e o seu cadastramento, vedado, porém, bloquear-lhes o trânsito se estiverem identificados (art. , § 8º, Lei nº 766/79).
  4. c) Loteamento condominial:aquele em que os lotes constituem unidades autônomas de um condomínio de lotes (art. , § 7º, Lei nº 766/79).
  5. A figura do “loteamento fechado” não é uma categoria jurídica autônoma, mas apenas uma nomenclatura didática e popular para designar os loteamentos que são murados e que impõem controle de acessos a pedestres e a veículos. Portanto, o loteamento de acesso controlado é um loteamento fechado e o loteamento condominial poderá vir a ser considerado um loteamento fechado, caso os condôminos assim decidam coletivamente e caso inexista restrição imposta pelo Município.

 

 

3.9. Os “loteamentos fechados atuais” podem adotar a forma de condomínio de lotes?

  1. Questão interessante é saber se os inúmeros “loteamentos fechados” atuais podem se transformar em condomínios de lotes.
  2. Se se tratar de um loteamento formalmente constituído, temos que essa conversão só será possível se houver concordância unânime dos titulares dos lotes e se o Município lhes transmitir a propriedade das áreas comuns (vias, praças etc.) que – lembre-se – tornaram-se bens públicos desde o registro do loteamento (art. 22, Lei nº 6.766/79). Nesse caso, só sobrará aos titulares dos lotes buscarem obter, no Município, a autorização para a realização de controle de acesso de pessoas e de veículos, de modo a que o seu loteamento tradicional torne-se um loteamento de acesso controlado. A grande desvantagem, porém, desse arranjo imobiliário é que nenhum titular de lote é obrigado a contribuir financeiramente com as despesas havidas por eventual associação de moradores em proveito da coletividade, conforme decisão do STJ (que, a nosso sentir, é acertada).
  3. Se, porém, se tratar de um “loteamento fechado” irregular (e aqui nos referimos aos que não foram devidamente constituídos, com a prévia aprovação de projeto de loteamento e o pertinente registro no Cartório de Imóveis), temos que é plenamente viável que a sua regularização se dê por meio da instituição de um condomínio de lotes ou por meio da instituição de um loteamento de acesso controlado. Isso dependerá do município. Ademais, no caso de se pretender regularizar esses “loteamentos fechados” irregulares como um condomínio de lotes, é fundamental atentar para a situação de propriedade tabular do terreno. Se o terreno não estiver no nome dos titulares dos lotes na proporção da fração ideal que eles haverão de ter no condomínio edilício, será necessário que essa propriedade seja transmitida aos titulares dos lotes, o que poderá ocorrer por diferentes maneiras, como a legitimação fundiária (art. 23da Lei nº 13.465/2017), a usucapião ou negócios jurídicos de transferência de imóvel.

 

4.Condomínio Urbano Simples:

  1. Uma nova forma de condomínio foi criada e, por atecnia topológica, não foi inserida no Código Civil. Trata-se do condomínio urbano simples, cuja disciplina está nos arts. 61 a 63 da Lei nº 12.465/2017.
  2. Essa nova espécie de condomínio somente se aplica a imóveis urbanos, conforme se extrai do seu nome.
  3. Embora tenha recebido um novo nome, trata-se, na realidade, de uma espécie de condomínio edilício que dispensa algumas formalidades em razão da sua pequena dimensão.
  4. Esse condomínio aplica-se a situações de terrenos onde haja mais de uma construção e em que o seu titular queira tornar cada uma dessas construções uma unidade autônoma de condomínio. Diante da sua simplicidade, o condomínio urbano simples dispensa a apresentação de convenção de condomínio.
  5. No texto do art. 61 da Lei 12.465/2017, é autorizado o condomínio urbano simples “quando um mesmo imóvel contiver construções de casas ou cômodos”. O texto ficou confuso no tocante ao verbete “cômodos”: ele é um complemento nominal de “construções” ou é um dos elementos do objeto direto vinculado ao verbo “contiver”. Independentemente da resposta, o fato é que é despropositado admitir que essa referência a cômodo esteja a permitir que, dentro de uma mesma casa, cada uma dos quartos se torne uma unidade autônoma. Não faz sentido admitir que uma casa com três quartos se dilua em um condomínio de três cômodos. Daí decorre que, ao tratar de cômodos, a lei quis se referir a situações de construções que possuam cômodos de acesso autônomos, como sói acontecer em prédios com vários quartos de acesso autônomo. Nesses casos, poder-se-ia também instituir o condomínio urbano simples.
  6. Em suma, o condomínio urbano simples poderá ser instituído em duas situações: (1) quando o terreno contiver várias edificações, como sucede com a vulga “casa dos fundos”; ou (2) quando o terreno contiver uma edificação na qual haja mais de um cômodo com acesso autônomo. Não se pode admitir o condomínio urbano simples para cômodos que estejam funcional e espacialmente conectadas, como no caso de quartos de um mesmo apartamento. É preciso haver autonomia funcional e de acesso no cômodo para ele constituir uma unidade autônoma de condomínio urbano simples.
  7. Como se trata de um condomínio, cada construção constituirá uma unidade imobiliária autônoma e, portanto, terá uma matrícula própria no Cartório de Imóveis. Além do mais, cada unidade autônoma deve ficar vinculada a uma fração ideal das áreas comuns, à semelhança do que sucede no condomínio edilício.
  8. No tocante à gestão do condomínio, embora se apliquem as regras de condomínio edilício no que couber (art. 61parágrafo único, da Lei nº 13.465/2017), os condôminos podem optar por uma via mais simples e podem fazer acordos por instrumentos particulares.
  9. Apesar da omissão legal, mas em atenção à simplicidade desejada para esse tipo de arranjo espacial, o registro desses acordos no Cartório de Imóveis (não na matrícula, e sim no Livro 3) é dispensado. Todavia, terceiros adquirentes que não tenham ciência desses acordos por outro meio estarão exonerados de observá-los. Em outras palavras, esses acordos escritos serão oponíveis a terceiros apenas se eles tomarem ciência deles antes da aquisição de uma unidade autônoma. Entendemos que, apesar de não ter sido feita nenhuma previsão expressa no art. 178da Lei de Registros Publicos (Lei nº 6.015, de 1973), esses acordos escritos devem ser equiparados às convenções de condomínio com fundamento no parágrafo único do art. 61 da Lei nº 13.465/2017, de sorte que, com base nesse fundamento, seria admitido o seu registro de modo facultativo no Livro 3 do Cartório de Imóveis para, se for interesse dos condôminos, produzir efeitos perante terceiros (art. 178III, da Lei de Registros Publicos).
  10. Não havendo acordo entre os condôminos, aí será o caso de valer-se das regras de condomínio edilício previstas a partir do art. 1.331do CC para que, em assembleia, a decisão observe o quorum de votação.
  11. A figura do condomínio urbano simples merece aplausos, porque é sensível a uma realidade bastante comum de terrenos em que, por exemplo, os pais constroem duas casas “nos fundos” para recepcionar os seus filhos. Nesses casos, os pais poderiam transformar a propriedade unitária em um condomínio urbano simples, abrindo matrícula para cada uma das unidades correspondentes às construções. Evidentemente, em nome do princípio da disponibilidade e da continuidade registral, nesse exemplo, as matrículas serão abertas em nome dos pais, que são os proprietários do terreno, de maneira que estes, se quiserem, poderão alienar a propriedade dessas unidades autônomas aos seus filhos mediante os procedimentos de praxe (escritura, registro, recolhimento do imposto de transmissão pertinente).
  12. Por fim, externamos nossa crítica ao nome de batismo utilizado, pois o mais adequado teria sido designar essa nova espécie de condomínio como “condomínio edilício simples”. Dever-se-ia empregar o verbete “edilício”, pois, na realidade, essa figura é o condomínio edilício com simplificações legais. Também não achamos adequado valer-se do verbete “urbano” na composição do nome, pois o instituto poderia, no futuro, ser aproveitado para áreas rurais também, se sobrevier lei expressa. Aliás, não enxergamos motivos para o legislador ter restringido essa figura a áreas urbanas. Talvez seja o caso de a doutrina, por analogia, admitir essa figura mesmo em áreas rurais.

 

  1. CONCLUSÃO:
  2. A Lei nº 13.465/2017 está a desafiar os civilistas com novas ferramentas e concepções de Direito das Coisas. No presente texto, cuidamos especificamente das novas espécies de condomínios e dos seus desdobramentos no regime de parcelamento do solo.
  3. Trata-se de avanços que convidam os juristas a calçarem a sandália da humildade para reconhecer que o “fetichismo institucional” de que tratava Roberto Mangabeira Unger – assim entendido o culto a institutos jurídicos antigos – representa uma perigosa patologia que pode comprometer o desempenho do principal papel do Direito das Coisas: garantir segurança proprietária em compatibilidade com a realidade social da atualidade. O jurista deve cultuar o passado, sem abandonar a ousadia de inovar para enfrentar o presente e o futuro. Como lembrava Richard Posner[6]“nossa história, nossas tradições e nossos antepassados não são nossos senhores, mas nossos instrumentos”.

 

Fonte: https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/478658357/novidades-da-lei-n-13465-2017-o-condominio-de-lotes-o-condominio-urbano-simples-e-o-loteamento-de-acesso-controlado