Novas perspectivas da Advocacia frente às mudanças trazidas com a mediação e a arbitragem

Atualmente, muito se fala sobre os métodos adequados de solução de conflitos – MASCs, sobretudo a mediação e a arbitragem. Todavia, imperioso se faz uma reflexão sobre o profissional do Direito e a sua profissão frente às mudanças trazidas nesta nova maneira de operacionalização do direito e da justiça.

O profissional do direito, assim como os profissionais em geral, tem sentido os efeitos das mudanças que têm se esboçado rapidamente, especialmente nas relações de comércio, interpessoais, demandando dos advogados uma indispensável mudança de paradigmas e de atitudes suficientes para se integrarem e se harmonizarem às tendências mundiais.

As transformações estruturais nos impõem condutas que, a mercê da nossa vontade, ou se temos ou não simpatia por elas, têm criado, modificado e extinto padrões que até então nos eram apresentados como o que tínhamos de melhor, porque se moldavam às nossas necessidades e, portanto, eram suficientes para as nossas pretensões.

Em nome da modernidade e da evolução, profissões de séculos vem sendo superadas e desaparecem, restando apenas o saudosismo daqueles que conviveram com tais ofícios, mas que inevitavelmente acabam se conformando com as inovações necessárias e impositivas dos tempos atuais.

Sabidamente, quando no banco da universidade, o advogado foi ensinado e treinado para combater, ou seja, aniquilar impiedosamente as pretensões do litigante inimigo. Por óbvio, não há de se culpar nossos colegas advogados pelo espírito de enfrentamento adquirido na faculdade, pois que a tônica do nosso trabalho é de combater o bom combate da justiça, procurando eticamente restabelecer direitos que tenham sido lesados ou ameaçados, e cumprir o dever de fazer o melhor pelos supostos direitos de nosso cliente.

Entretanto, para se desincumbir dessa luta pela justiça, não necessariamente precisamos estar em lados opostos o tempo todo, embora ainda persista o conceito de uma estrutura legalista e extremamente formal, razão porque julgamos estar bem protegidos dentro de um sistema que achamos, se bem manuseado, acabará nos contemplando com os louros da vitória. Ledo engano!

Esse procedimento conflituoso e adversarial instalado na esfera judicial, justifica-se pelas próprias regras do confronto, que ao invés de convergir para um possível acordo e disponibilizar tempo nesta tentativa, prestigiando o diálogo, fomenta ainda mais a disputa jurídica com um emaranhado de normas processuais, cuja consequência extrapola até mesmo o campo do embate legal, desencadeando, muitas vezes, uma implacável animosidade entre os litigantes, jogando por terra qualquer resquício de possibilidade de comunicação e construção do consenso.

Com o passar do tempo, a sociedade vem mudando seu modo de pensar e de viver, seus hábitos, e até mesmo seu modo de resolver seus conflitos. O mundo em acelerada transformação nos desafia, a todo instante, a repensar nossos conceitos, ideias e métodos de atuação para avaliarmos opções mais adequadas e compatíveis com os novos e complexos tempos.

 

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O Judiciário, então detentor do monopólio na arte de dizer o direito, até há pouco tempo, era a única porta de acesso à solução de conflitos. Contudo, como todos sabem, essa é uma via engessada, rígida e extremamente demorada, em que a batalha jurídica é complicada, divergente, onerosa e desgastante para todos os envolvidos. É uma guerra em se pode até prever o início, porém, jamais o final, e apenas duas coisas são certas: sempre haverá um vencedor e um perdedor e nem sempre vencer será sinônimo de ganhar.

Soluções têm se tentado na esfera judicial, com incisivos alardes à reforma que se está querendo implantar, porém não passam de expectativas e modificações meramente paliativas, porque ainda estarão longe de sistematizarem ações aptas a agilizar a contento a prestação jurisdicional. Tais alterações servirão apenas para se suprimir esta ou aquela instância recursal ou mesmo tornar menos moroso determinado momento processual, porém, objetivamente, ainda ficará muito aquém do ideal a que tem por proposta.

Neste contexto de contundentes mudanças nas relações interpessoais, internas e além-fronteiras, mirando até mesmo à queda dos muros da então intocável soberania territorial, temos que nos adaptar às inovações e soluções que têm contemplado todos os campos de ação onde, necessariamente, o judiciário é parte integrante.

Ciente dessa realidade, o legislador foi extremamente feliz ao se pronunciar favoravelmente à criação de uma lei que deu nova roupagem a então legislação existente dos institutos milenares da mediação e da arbitragem, há décadas utilizadas pelos países desenvolvidos.

Promulgada em 23 de setembro de 1996, a Lei Federal n. 9.307 denominada de Lei da Arbitragem, com as inovações trazidas pela Lei 13.129/15, têm encontrado entusiastas e alguns adversários, que certamente o são por desconhecimento da nova lei e seus inúmeros benefícios, e outros ainda por medo de se defrontarem com este novo e eficiente paradigma que, juntamente com a conciliação e a mediação, ressurgem como adequadas formas de resolução de conflitos.

Hoje, não mais se concebe métodos obsoletos, inflexíveis, injustos e demasiadamente lentos na prestação jurisdicional, pois consoante inteligentemente afirmado por Rui Barbosa: “A justiça atrasada não é justiça, senão injustiça, qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito escrito das partes, e assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade”.

Renasceu, de forma triunfal, em consonância com as legislações mais modernas do mundo a respeito do tema, os métodos adequados de solução de conflitos, que devolvem ao cidadão o poder de condução do seu próprio destino, pela liberdade de opção, dentro do seu pleno e livre exercício da vontade, por meio de procedimentos adaptados aos novos tempos e que possuem como características principais a flexibilidade, a eficiência, a economia, a celeridade e a segurança jurídica.

Estes procedimentos, desvinculados do Poder Estatal, têm total caráter de autonomia e independência, não necessitando de qualquer ingerência do Estado, a não ser quando extremamente necessária, sendo que das decisões proferidas por Arbitragem, não cabe qualquer recurso para rever a matéria objeto do litígio e não necessita da chancela do Judiciário para gerar os legais efeitos originados na Sentença Arbitral, conforme preconiza o artigo 18 da Lei 9.307.

O principal objetivo de um processo de mediação ou de arbitragem é o de propiciar e dar liberdade às partes em conflito, desde a opção pelos institutos, a elaboração das regras a ser utilizadas no procedimento, a determinação do prazo para a prolação da sentença e de nomearem especialistas da sua confiança ou até mesmo elegerem algum órgão especializado em Mediação e Arbitragem, onde o procedimento regular-se-á pelas regras da Instituição nomeada.

Dentro dessa filosofia da nova lei, uma questão importante e fundamental trouxe certo desconforto à classe dos advogados: a possibilidade de também serem nomeados como árbitros ou mediadores, profissionais outros que não somente os nobres causídicos e também a possibilidade de as partes comparecerem nas audiências sem o acompanhamento de um profissional do direito, podendo postular em causa própria ou nomearem outros para representá-los ou assisti-los no procedimento escolhido.

Acredito que o legislador foi sábio quando se determinou por abrir o caminho para que outros profissionais também pudessem desenvolver a arte de dizer o direito, porque se assim não fosse, pouca inovação haveria em tais procedimentos privados, uma vez que o juiz estatal, via de regra, é profundo conhecedor das leis, contudo, quando necessita de um parecer mais técnico de uma matéria que foge ao seu conhecimento, socorre-se de um perito, um autêntico especialista naquele caso em julgamento e, apesar de não estar condicionado a julgar pelo laudo apresentado, geralmente o chancela, pois tal pronunciamento geralmente tem um papel fundamental no livre convencimento do nobre magistrado quando proferir seu julgado.

Em um procedimento por Arbitragem, a regra é que sejam nomeados especialistas na matéria objeto do litígio, sejam estas questões jurídicas ou técnicas, legando ao profissional contratado a condução do processo dentro de técnicas específicas para cada procedimento, podendo, ao final, quando o caminho escolhido foi o arbitral, proferir sentença com base no seu conhecimento específico sobre a matéria, sem se descuidar, todavia, das provas trazidas aos autos as quais deverão servir de base para sua convicção e decisão, agindo, desta forma, na condição de perito-árbitro.

Quanto à capacidade postulatória e à possibilidade de prescindir de um estudioso da lei na defesa da parte via juízo arbitral, o legislador não tinha em mente dispensar os relevantes e necessários serviços prestados pelo advogado na administração da justiça, ao contrário, embora não seja obrigatório é amplamente recomendável que as partes estejam acompanhadas de advogados, sobretudo nos procedimentos de arbitragem, para que estes lhes prestem assessoria jurídica, papel este não desempenhado pelo Mediador ou Árbitro.

A experiência tem provado e comprovado que a presença de um advogado em um procedimento de Arbitragem e até mesmo de Mediação tem uma importância fundamental, pois é o profissional adequado e perfeitamente familiarizado com os ditames jurídicos indispensáveis ao sucesso na pretensão de levar a bom termo o litígio e estarem sempre atentos à particularidade jurídica formal e material de cada caso levado ao conhecimento do juízo arbitral.

Outro fator fundamental, de extrema importância e determinante da necessidade do advogado no processo de arbitragem, diz respeito à impossibilidade de se recorrer da decisão proferida neste juízo privado. Ora, temerosa será a dispensa de um profissional do direito na administração da causa, sabendo-se de antemão que um procedimento por arbitragem se desenvolve em uma única instância e que devem as partes se precaver com todos os cuidados necessários, para bem instruírem o processo com todos os elementos indispensáveis às suas pretensões, porque a decisão é única e não mais poderá ser modificada, a não ser pelo desrespeito as regras formais indispensáveis à validade do processo submetido ao juízo arbitral.

Cientes da importância da presença do profissional do Direito na defesa do seu constituinte, as entidades especializadas em Mediação e Arbitragem são unânimes em seus regulamentos, em darem substancial destaque ao recomendar que o advogado deva ser presença fundamental e indispensável na condução do procedimento privado escolhido pelas partes em conflito. Esta é uma preocupação saudável para a classe quando se pronuncia sobre a indispensabilidade de um defensor habilitado na administração da justiça, buscando-se ela na via estatal ou privada.

Procurando dissipar ainda mais o temor dos nobres advogados com relação aos métodos adequados de solução de conflitos, podemos elencar inúmeras vantagens na utilização de tais institutos, especialmente no tocante à sua atividade nesse novo e promissor mercado, pois além da atuação como defensor das partes em litígio, eles poderão, em processos outros, serem nomeados como mediadores ou árbitros, criando-se, assim, uma nova oportunidade de trabalho e ampliando ainda mais a sua possibilidade profissional.

Também, outro ponto que interessa diretamente é o fato de que os honorários advocatícios contratuais serão auferidos rapidamente em razão da característica da celeridade na solução de um processo via juízo arbitral, pois no máximo em 180 dias, no caso da arbitragem, a demanda é resolvida, além de serem contemplados com honorários arbitrais quando nomeados para a função de arbitrar algum conflito. Ainda, existem os honorários conciliatórios quando atuarem nas mediações privadas.

A ordem mundial está em franca ebulição e é imperioso acompanhar a tendência desse processo evolutivo, pois tais transformações nos impõem também novas exigências e o novo mercado tende a ser cruel e seletivo, deixando de lado aqueles que, apesar dos reclames da modernidade, insistem em manter um espírito de indiferença, acomodação e indolência, sentimentos execráveis na concepção dos novos tempos.

A verdade é que os fatos e as relações sociais mudam e devem ser revistos, não como uma imposição maléfica, mas como novas e promissoras oportunidades, adaptando-nos a padrões até então desconhecidos e que podem nos surpreender se bem explorados. A nossa natural e humana propensão é a de nos sentirmos incomodados ante a qualquer mudança em nossa situação e a tendência, na maioria das vezes por medo ou desconhecimento, é de repelirmos e contestarmos esses fantasmas que supomos nos ameaçar, antes mesmo de nos dedicarmos a conhecer e descobrir as suas verdadeiras razões.

A transformação necessária por que passa o Poder Judiciário, em hipótese alguma deve ser negligenciada pelos ilustres advogados, pois há uma explícita e inevitável mudança de paradigma no cenário jurídico, especialmente na nobre função de dizer o direito, objetivando sempre atingir um conceito de justiça em seu mais alto grau, independente do caminho a ser percorrido para tanto, pois sendo pública ou privada a forma utilizada para se chegar a ela, o importante é que seja devolvida ao cidadão, com competência, credibilidade, segurança, celeridade e de forma satisfatória, a virtude de se dar a cada um aquilo que é seu.

Administrar, cada um a seu modo, o propósito de resgate da dignidade ao jurisdicionado, tanto o poder público como, agora, o poder privado, legalmente constituído, devem priorizar o objetivo comum a que tem por proposta, mantendo-se conscientes sempre de que não há qualquer rivalidade ou concorrência no trabalho que cada um desenvolverá na busca da justiça, uma vez que não aceita adjetivos, ela é uma e indivisível, diferenciando-se apenas a maneira como será atingida, seja através do juiz, do mediador ou do árbitro.

O que diferenciará, todavia, os métodos adequados de solução de conflitos é a total mudança de procedimento que as regerá, pois enquanto na via estatal o embate jurídico e o tão conhecido excesso de formalismo, culminado inevitavelmente com o atraso na prestação jurisdicional, continuará regulando este intrincado mecanismo de solução de conflitos, nestes novos sistemas da Conciliação, da Mediação e da Arbitragem priorizar-se-á a prática determinante de procedimentos que terão, além da fundamental celeridade, o aspecto da união de esforços, tanto pelas partes quanto por seus defensores, na busca de uma solução extremamente mais harmônica, conciliadora, amigável e perfeitamente possível, desenvolvendo-se um trabalho, todo o tempo, com honestidade e boa-fé, conscientes de que a priorização do diálogo deve ser a tônica do procedimento onde, ao final, certamente haverá benefícios mútuos, em função do resultado favorável às partes, tanto na supressão de gastos desnecessários quando da submissão a um procedimento judicial que certamente demoraria anos para que fosse resolvido, mantendo assim, na maioria das vezes um mínimo desgaste possível na relação entre os litigantes ou ainda harmonizando uma relação interpessoal que já existia conflituosa, especialmente nos processos submetidos à Mediação.

Ademais, o aspecto harmônico que caracteriza os institutos é fruto que se abstrai do próprio espírito a que tem por proposta o novo Código de Processo Civil, que entrará em vigência em 2016, priorizando o aspecto do pleno e livre exercício da vontade das partes na escolha por esses novos e adequados sistemas de resolução de controvérsias.

Essas diferenciadas características que tão bem definem esses institutos, por si só despertarão uma nova reflexão, especialmente ao Advogado, pois inauguram uma nova forma de se chegar à justiça em seu conceito mais nobre, adentrando em um novo e promissor campo, procurando desenvolver seu trabalho com uma tendência mais harmônica e pacífica, ciente de que tais atitudes reverterão em favor destes tão festejados sistemas de solução de controvérsias que, a curto ou médio prazo, será os necessários e eficientes paradigmas na tão nobre arte de solucionar conflitos, apresentando justiça plena e paz social.

 

MELANIE DE CARVALHO TONSIC – Advogada. Palestrante. Consultora. Mediadora. Arbitralista. Fundadora e Presidente da ACORDIA Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem. Membro da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB/MT.

 

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