É Legal o desconto de pontualidade na taxa de condomínio?

A taxa condominial é uma imposição aos condôminos para contribuírem com as despesas ordinárias e extraordinárias, as quais foram aprovadas na Assembleia Geral Ordinária, por meio de uma previsão orçamentária prévia apresentada aos presentes.

Sabemos que um condomínio necessita de receitas para se mantiver vivo e cumprir com suas obrigações em dia. Para isso, os condôminos deverão adimplir pontualmente o pagamento das taxas, sob pena de acarretar prejuízo a sociedade condominial como a falta de dinheiro em caixa para honrar com compromissos.

Evitar a inadimplência nos condomínios é um dos meios mais buscados pelos síndicos, com o objetivo de manter segurança tanto administrativa como jurídica, como no caso de ações judiciais por falta de cumprimento da obrigação entre as partes.

Dentro desses meios buscados, podemos citar o desconto de pontualidade no pagamento das cotas condominiais. Consiste em um mecanismo de incentivar o condômino a fazer o pagamento da cota antes do prazo de vencimento estipulado no boleto, o que, no caso gera um desconto. Tem o objetivo também reduzir a inadimplência.

Entretanto, esse meio deve ser adotado com as devidas cautelas que serão analisadas, sob pena de ocorrer ilegalidade no desconto.

Alguns entendem que o desconto de pontualidade pode caracterizar o instituto do bis in idem (repetição de uma sanção no mesmo fato), ou seja, seria uma cláusula penal disfarçada cumulado com a multa moratória de 2% a.m.

Exemplo para melhor clarificar o entendimento: vamos supor que um determinado condomínio adere ao desconto de pontualidade. Nos boletos encaminhados aos condôminos está descrito que o desconto e pagamento é até o 10/01, passado este prazo, começa incorrer em juros e multas sobre o débito pendente. Ou seja, será cobrado o valor normal fixado (sem desconto), com juros e multas.

Observam-se os seguintes julgados:

APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DE COBRANÇA DE TAXAS CONDOMINIAIS INÉPCIA DA INICIAL E CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO OCORRÊNCIA ÔNUS DA PROVA DOS RÉUS DESCONTO DE PONTUALIDADE MULTA MORATÓRIA BIS IN IDEM. Não é inepta a inicial que esclarece a relação jurídica existente entre as partes, o período do débito e o valor devido, ainda que de forma sucinta. Não há cerceamento de defesa se a prova oral requerida pelos réus é manifestamente desnecessária ao julgamento da lide. Na ação de cobrança de cobrança de condomínio, é ônus do proprietário comprovar o pagamento das taxas de condomínio (CPC 333 II). O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito (CC 1.336 § 1º). Havendo atraso no pagamento da taxa de condomínio, não é cabível a incidência da multa moratória no valor fixado sem o desconto de pontualidade, porque configura bis in idem. Rejeitou-se as preliminares e deu-se parcial provimento ao apelo dos réus.

(TJ-DF – APC: 20140910033938, Relator: SÉRGIO ROCHA, Data de Julgamento: 21/10/2015, 4ª Turma Cível, Data de Publicação no DJE: 04/11/2015. Pág.: 332).

 

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DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. MULTA MORATÓRIA. LIMITAÇÃO. DOIS POR CENTO. DESCONTO PONTUALIDADE. CLÁUSULA PENAL AO INVERSO. 1. O Código Civil, com a previsão contida no já referido art. 1.336, § 1º, pôs termo a uma infindável controvérsia acerca da possibilidade de limitação da multa moratória incidente sobre débitos condominiais em atraso. Pela nova disciplina, o encargo não pode ser estipulado em patamar superior a 2% (dois por cento). 2. A doutrina aponta que, após o disciplinamento da matéria, o sistema das administrações condominiais criou a chamada “cláusula penal ao inverso”, a que se refere Sílvio de Salvo Venosa. Helder Martinez Dal Col: “A concessão do ‘desconto’ de pontualidade é, em verdade, pena disfarçada, multa exorbitante camuflada, posto que o valor normal da despesa de condomínio (ou do aluguel, no que pertine às relações locatícias) realmente pactuado é, na generalidade dos casos, aquele previsto para pagamento pontual com desconto e não o valor cheio“. Se a lei, em norma de ordem pública, limitou a 2% (dois por cento) o valor da multa moratória, não é lícito o agravamento do encargo. 3. À vista dessa constatação, a única solução possível, do ponto de vista legal, é a desconsideração da penalidade dissimulada, a esse propósito, na cobrança empreendida, devendo ser considerado o valor da mensalidade, com o desconto, como base de cálculo para a incidência da multa, em caso de atraso no pagamento ou de inadimplemento. 4. Recurso de apelação parcialmente provido.

(TJ-DF – APC: 20140110685294 DF 0016266-05.2014.8.07.0001, Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Data de Julgamento: 01/10/2014, 3º Turma Cível, Data de Publicação no DJE: 06/10/2014. Pág.: 121).

De outro lado, alguns entendem como possível a concessão do desconto de pontualidade, entretanto, para colocar em prática deverá adotar formas para não caracterizar o bis in idem, com o objetivo também do síndico estimular os condôminos a cumprirem com a obrigação.

Um exemplo de forma que poderá aderir: um determinado condomínio adota tal desconto, sendo estipulado no boleto o pagamento até a data 15/01, mas aqueles que fizerem o pagamento até a data 07/01, terá direito ao desconto, o que não acontecerá se passar este prazo, que no caso o valor será cheio/normal.

Nesse exemplo acima, o condomínio dispõe certo prazo para o pagamento com desconto, bem como posteriormente, prazo para pagamento da cota condominial com seu valor normal. Isto é, o condômino terá a liberdade de escolher.

Vale fazer referência ao trecho de um julgamento de Agravo em Recurso Especial nº 873.603, o qual cita a seguinte tese:

“A alegação recursal de comprovação da abusividade da cobrança perpetrada pelo condomínio agravado foi afastada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios nos seguintes termos (e-STJ, fls. 186-189):

No que se refere ao denominado “desconto de pontualidade”, algumas ponderações hão que ser feitas. Geralmente quando se fala, em “desconto de pontualidade”, esse instituto é tratado como gênero. Contudo, vislumbram-se nele duas espécies/circunstâncias distintas: o desconto de pontualidade propriamente dito, e o desconto em razão de antecipação do pagamento das despesas condominiais. Na verdade, o desconto de pontualidade seria gênero, do qual o desconto por antecipação seria espécie. Melhor esclarecendo, o desconto advindo do pagamento por antecipação seria aquele pelo qual o condomínio, após aprovação, estabelece, por exemplo, que a taxa condominial terá vencimento no dia 10 do mês de referência e será concedido um desconto de determinado percentual ou de um valor fixo se o pagamento for realizado até o terceiro dia útil do mês de referência, por exemplo. Nesse caso, se o condomínio efetua o pagamento de forma adiantada, de fato, é beneficiado com o pagamento a menor, mostrando-se esse desconto verdadeiro, real. Caso efetue somente a partir do terceiro dia do mês de referência até o dia 10, deverá pagar o valor normal. Essa espécie de desconto por antecipação é perfeitamente admitida e nela não se vislumbra nenhuma irregularidade. Entretanto, há casos outros em que o condomínio estipula, por exemplo, que o condômino poderá auferir um desconto de determinado valor se realizar o pagamento das despesas condominiais até o dia de seu vencimento. Passado, porém, um dia após o vencimento e não efetuado o pagamento, pode o condomínio cobrar do condômino não só o valor normal fixado para a taxa de condomínio – sem o denominado desconto de pontualidade -, como também juros de mora em virtude do inadimplemento e da multa de até 2% sobre o débito em razão do atraso, como preconizado no parágrafo 1º do art. 1.336 acima descrito. Nessa última hipótese, o valor apontado como desconto pela pontualidade não seria mais do que uma forma disfarçada de fixação de multa exorbitante pelo atraso no pagamento da taxa condominial, pois no caso de inadimplência, o condômino seria duplamente penalizado, pois deverá pagar o valor fixado para a taxa mais a multa de 2%. Evidentemente, isso implica em duplicidade da multa incidente sobre um mesmo fato gerador, o que não se mostra lícito. Ou se aplica o desconto ou a multa moratória, jamais as duas. Na realidade, nessa última hipótese, o valor real da taxa condominial é aquela estabelecida com desconto, e não o valor cheio, visto que o condomínio não pode contar com aquele acréscimo em sua contabilidade, já que existe a possibilidade de todos os condôminos pagarem na data do vencimento, beneficiando-se do cogitado “desconto“.

Cumpre ressaltar também, que para tornar legal necessita estar expresso na convenção do condomínio, caso não esteja, deverá ser convocada assembleia para deliberação e alteração da convenção, incluindo esta possibilidade, dependendo da aprovação de 2/3 dos condôminos.

Não pode o síndico estipular para um ou alguns condôminos o desconto, o que caracterizaria abuso de poder, bem como fere o princípio da impessoalidade, podendo ser responsabilizado por seus atos.

Portanto, apesar de haver divergências, entendemos pela legalidade do desconto pela pontualidade no pagamento, entretanto, deve-se adotar uma estratégia na previsão orçamentária para não acontecer à falta de dinheiro pelos descontos, bem como nos procedimentos adequados para não tornar ilegal.

MIGUEL ZAIM – (Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, Especialista em Direito Imobiliário, Direito e Processo Penal, Direito e Processo Civil, Direito Constitucional, Direito Tributário, e Direito Ambiental, Presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB Mato Grosso).

 

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