Decisão polêmica de Juiz : Cobrança de despesas condominiais. Execução de título extrajudicial.

Cobrança de despesas condominiais. Execução de título extrajudicial.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2251759-87.2020.8.26.0000, da Comarca de Taboão da Serra, em que é agravante CONDOMÍNIO RESIDENCIAL MORADAS DO BOSQUE, é agravada ALESSANDRA FARIAS RIBEIRO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 35ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores ARTUR MARQUES (Presidente) e MELO BUENO.

São Paulo, 29 de outubro de 2020.

GILSON DELGADO MIRANDA

Relator

Voto n. 20.515

CONDOMÍNIO EDILÍCIO. Cobrança de despesas condominiais. Execução de título extrajudicial. Penhora de imóvel objeto de alienação fiduciária em garantia a terceiro. Impossibilidade. Bem não integra o patrimônio da parte executada. Possibilidade, apenas, de penhora dos direitos da parte executada oriundos do contrato. Precedentes do STJ e desta Câmara. Recurso não provido.

Vistos.

Cuida-se de recurso de agravo de instrumento interposto contra a decisão de fls. 148/149 dos autos n. 100696396.2018.8.26.0609 , complementada a fls. 157 (embargos de declaração), proferida pela juíza da 2ª Vara Cível da Comarca de Taboão da Serra, Rachel de Castro Moreira e Silva, que, em sede de execução de despesas de condomínio, deferiu apenas “a penhora sobre os direitos da executada que recaem sobre o imóvel, descrito na matrícula nº 16.392 do Cartório de Registro de Imóveis de Taboão da Serra (fl. 137/140), em nome de Alessandra Farias Ribeiro” .

[adrotate group=”1″]

Segundo o agravante, exequente, a decisão deve ser reformada, em síntese, “para que seja determinado ao MM. Juiz ‘a quo’ que defira a penhora sobre a totalidade do imóvel e não apenas sobre seus direitos, independentemente da existência ou não de credor fiduciário por ser uma questão de direito, face a regra processual e a jurisprudência dominante”.

Recurso tempestivo e preparado (fls. 34/35), foi processado sem tutela provisória e não foi respondido (a agravada, executada, não constituiu advogado nos autos).

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

Esse é o relatório.

O recurso não merece provimento.

Não se desconhece que, em casos como o dos autos, havia neste egrégio Tribunal de Justiça corrente jurisprudencial sólida e muito bem fundamentada no sentido de que o “crédito do condomínio” é “garantido pela própria unidade autônoma (obrigação ‘propter rem’)” e “prefere aos créditos de instituições financeiras, inclusive créditos hipotecários. Não se desconhece o esforço legislativo para transformar a alienação fiduciária em instrumento cada vez mais poderoso. No que aqui interessa, vale anotar que ao artigo 27 da Lei n. 9.154/1997 a MP 2.223/2001 e, ao depois, a Lei n. 10.931/2004, incluiu o § 8º, com a seguinte redação: ‘Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.’ Essa disciplina, porém, muitos entenderam insuficiente para livrar os credores fiduciários (titulares do domínio resolúvel do bem imóvel) das dívidas condominiais, sem prejuízo da responsabilidade dos devedores fiduciantes. Daí porque, recentemente, veio a lume a Lei n. 13.043, de 2/8/2014, que introduziu no Código Civil o artigo 1368-B e respectivo parágrafo único, in verbis: Art. 1.368-B. A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. Parágrafo único. O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem. A questão que se põe é se as regras legais acima transcritas são suficientes para subtrair ao crédito condominial a natureza ‘propter rem’. Evidente que o condomínio dificilmente conseguirá satisfazer seu crédito, pois é notório que o devedor fiduciante que não paga as despesas condominiais também não paga as parcelas do financiamento e, pois,

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

em vez de direitos, quanto ao contrato de financiamento, ordinariamente só lhe sobejam obrigações. E o mais contraditório é que, então, o titular do domínio (resolúvel) não estará obrigado a pagar as despesas condominiais e nem responderá o imóvel pelas dívidas condominiais… Ora, segundo entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, o condomínio pode demandar qualquer um dos devedores, alguns ou todos, a seu critério, porque são solidários. E se um ou mais não forem demandados, nem por isso o imóvel remanescerá respondendo, integralmente, pela dívida. Ainda que se queira afirmar que o credor fiduciário, titular do domínio resolúvel, não é devedor (como se extrai das regras legais acima postas), isso não quer dizer que o imóvel (unidade autônoma) deixe de responder pelo débito, podendo o credor fiduciário, quando intimado da penhora do bem, quitar a dívida ou satisfazer seu crédito, no todo ou em parte, com o que sobejar do produto da arrematação, depois de satisfeito o condomínio” (TJSP, Agravo de Instrumento n. 2131054-65.2017.8.26.0000, 27ª Câmara de Direito Privado, j. 08-08-2017, rel. Des. Mourão Neto).

Entretanto, fato é que, sobre a questão da penhora de imóvel alienado fiduciariamente para quitação de taxas ou despesas condominiais, o Superior Tribunal de Justiça, bem ou mal, mal ou bem, consolidou-se em sentido contrário: “não se admite a penhora do bem alienado fiduciariamente em execução promovida por terceiros contra o devedor fiduciante, visto que o patrimônio pertence ao credor fiduciário, permitindo-se, contudo, a constrição dos direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária” (STJ, AgInt-AREsp n. 1.654.813-SP, 3ª Turma, j. 29-06-2020, rel. Min. Nancy Andrighi).

Vale dizer, “como a propriedade do bem é do credor fiduciário, não se pode admitir que a penhora em decorrência de crédito de terceiro recaia sobre ele, mas podem ser constritos os direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária” (STJ, AgInt-REsp n. 1.832.061-SP, 4ª Turma, j. 20-04-2020, rel. Min. Maria Isabel Gallotti).

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

16-03-2020, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva; e 3) STJ, AgInt-REsp n. 1.819.448-SP, 4ª Turma, j. 03-03-2020, rel. Min. Raul Araújo.

Em tempos recentes, assim também decidiu reiteradamente esta colenda Câmara: 1) TJSP, Agravo de Instrumento n. 2169644-09.2020.8.26.0000, 35ª Câmara de Direito Privado, j. 21-09-2020, rel. Des. Flavio Abramovici; 2) TJSP, Agravo Interno n. 2047310-70.2020.8.26.0000/50000, 35ª Câmara de Direito Privado, j. 06-07-2020, rel. Des. Melo Bueno; 3) TJSP, Agravo de Instrumento n. 2031122-02.2020.8.26.0000, 35ª Câmara de Direito Privado, j. 07-04-2020, rel. Des. Morais Pucci; e 4) TJSP, Agravo Interno n. 2032767-62.2020.8.26.0000/50000, 35ª Câmara de Direito Privado, j. 31-03-2020, rel. Des. Artur Marques.

Assim sendo e levando em consideração que o atual sistema processual é pautado por uma política de valorização dos precedentes, chegando-se a impor que “os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente” (artigo 926 do Código de Processo Civil) e ressaltando-se, na exposição de motivos do anteprojeto, que “a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores deve nortear as decisões de todos os tribunais e juízos singulares do país, de modo a concretizar plenamente os princípios da legalidade e da isonomia” , curvo-me a essa orientação.

Posto isso, nego provimento ao recurso. Deixo de arbitrar honorários recursais em favor da parte agravada, pois eles “não têm autonomia nem existência independente da sucumbência fixada na origem e representam um acréscimo ao ônus estabelecido previamente, motivo por que na hipótese de descabimento ou de ausência de fixação anterior, não haverá falar em honorários recursais” (STJ, “Jurisprudência em Teses”, edição n. 128, de 28-06-2019, tese 6).

GILSON MIRANDA

Relator

Assinatura Eletrônica

 

Fonte: Jusbrasil

LEIA TAMBÉM

FAÇA PARTE DOS NOSSOS GRUPOS 

👉 GRUPOS WHATSAPP👈

👉GRUPO TELEGRAM👈

👉INSCREVA-SE NO YOUTUBE👈