Contrato de aprendizagem nos condomínios

O contrato de aprendizagem é um contrato de trabalho especial, em que o empregador se compromete a assegurar ao aprendiz formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral, psicológico, e o aprendiz a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação.

A aprendizagem pode ser definida como:

“sistema em virtude do qual o empregador se obriga, por contrato, a empregar um jovem trabalhador e a lhe ensinar ou a fazer que se lhe ensine metodicamente um ofício, durante período previamente fixado, no transcurso do qual o aprendiz se obriga a trabalhar a serviço do dito empregador”. MAGANO, Octávio Bueno. Manual de direito do trabalho: direito tutelar do trabalho. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: LTr, 1992. v. IV, p. 145.

O art. 428 da CLT, com a redação que foi dada pelas Leis 10.097/2000, 11.180/2005 e 11.788/2008, estabelece as regras gerais sobre o contrato de aprendizagem:

Art. 428 DA CLT.:. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.

Por sua vez, o artigo 429 da CLT dispõe que os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional.

O Código Civil, por sua vez, traz o conceito de estabelecimento em seu artigo 1.142, da seguinte forma

Art. 1.142 DO CC.: Considera-se estabelecimento todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária.

Nesse passo, é plenamente factível se concluir um condomínio residencial não se enquadra no conceito de estabelecimento, por se tratar de ente despersonalizado, sem bens organizados. Também não há exercício de atividade empresária.

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De outro lado, o Ministério do Trabalho e Emprego editou em 2018, a Instrução Normativa 146 de 24/07/2018, a fim de abranger os condomínios no conceito de estabelecimento, consoante a seguir transcrito:

Art. 2º Conforme determina o art. 429 da CLT, os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a contratar e matricular aprendizes nos cursos de aprendizagem, no percentual mínimo de cinco e máximo de quinze por cento das funções que exijam formação profissional.

(…)

  • 4° Os estabelecimentos condominiais, associações, sindicatos, igrejas, entidades filantrópicas, cartórios e afins, conselhos profissionais e outros, embora não exerçam atividades econômicas, estão enquadrados no conceito de estabelecimento, uma vez que exercem atividades sociais e contratam empregados pelo regime da CLT.

Em nosso Sistema Normativo, o topo da pirâmide proposta por Hans Kelsen, está a Constituição, que representa a Lei maior, tendo abaixo desta os Tratados Internacionais, as Leis Complementares e as Leis Ordinárias, e ainda compõem o quadro os Decretos, os Decretos Legislativos e as Resoluções.

As Portarias, Instruções Normativas, Avisos, Regimentos, também são normativos, mais detalhistas, os quais devem de forma estrita, satisfazer os preceitos contidos nas Leis, as quais devem estar em consonância com a Constituição e com a Legislação Ordinária.

A Instrução Normativa diz o que os agentes daquele órgão público devem seguir, executar, fazer ou respeitar, bem como a Instrução Normativa descreve a respeito das atribuições que devem ser seguidas por aqueles parâmetros específicos naquele ato administrativo.

Importante destacar a hierarquia que as leis devem se submeter, sob pena de que as mesmas podem provocar verdadeiros conflitos no momento de aplicação da lei ao caso concreto.

Nesse sentido, é a lição da doutrina:

A legislação trabalhista como um todo, originada do Estado, também inclui disposições inseridas em atos do Poder Executivo. Nesse aspecto, primeiramente, cabe fazer menção aos Regulamentos Presidenciais, ou seja, decretos que regulamentam certas leis pertinentes ao Direito do Trabalho. Cabe destacar que referidas disposições não podem alterar normas legais, nem versar sobre questões de competência da lei propriamente, mas apenas regulamentar a sua fiel execução (art. 84, inciso IV, da Constituição Federal). (GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa Curso de direito do trabalho – 11ª ed., rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2017.)

 

Em síntese, a Instrução Normativa é um ato administrativo o qual deve estar em consonância com todo o ordenamento jurídico, e, consequentemente, é inadmissível o enquadramento dos condomínios residências como sendo “estabelecimento” para fins de aplicação na norma prevista no artigo 429 da CLT.

Noutro pensar, o § 4º do art. 428 da CLT determina que “a formação técnico-profissional a que se refere o caput deste artigo caracteriza-se por atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho”.

Assim sendo, nem todas as atividades laborais são compatíveis com a aprendizagem, porquanto, via de regra, as atividades desenvolvidas no condomínio consistente em trabalhadores que desempenham as funções de portaria, segurança, limpeza entre outras atribuições que sequer corresponderiam à formação técnico profissional compatível com a aprendizagem.

Da mesma forma já decidiu o Egrégio TRT da 2ª região, in verbis:

“CONDOMÍNIO EDILÍCIO DE NATUREZA RESIDENCIAL. CONTRATAÇÃO DE APRENDIZ. INEXIGIBILIDADE. O condomínio é a propriedade comum de um bem por duas ou mais pessoas. No caso do condomínio edilício, é a propriedade comum sobre partes de uma edificação, art. 1.331 do Código Civil. Ou seja, o condomínio não é estabelecimento e nem tem estabelecimento porque não se trata de uma organização de bens destinada ao exercício de atividade econômica. Tampouco se exerce no condomínio atividade social voltada à assistência e às demandas da sociedade. Esse ente despersonalizado que em determinadas relações se equipara à pessoa jurídica, repita-se, trata-se da figura da copropriedade mediante rateio das despesas necessárias à manutenção da coisa comum na proporção das frações ideais detidas pelos condôminos. Como se vê, embora se trate de empregador por equiparação nos precisos termos do § 1º do art. 2º da CLT, o condomínio edilício não se enquadra no conceito do § 2º do art. 9º do Decreto 5.598/2005. Por conseguinte, não está obrigado a contratar aprendizes, não subsistindo o auto de infração lavrado pelo descumprimento de regra que àquele não se aplica, qual seja, a do art. 429 da CLT. Recurso ordinário ao qual se dá parcial provimento para tornar insubsistente o auto de infração e a multa administrativa aplicada em razão daquele” (TRT 2ª Região; 0000600-43.2015.5.02.0445; 12ª Turma; Relator: Desembargador Benedito Valentini; DOE: 08/12/2016).

Ante o exposto, diante do caso concreto, deverá ser analisado primeiramente a destinação do edifício (residencial, comercial ou misto), bem como, proceder uma avaliação do quadro de funcionários para saber se as atividades desenvolvidas pelos funcionários são compatíveis com o preceito do § 4º do art. 428 da CLT, pelo qual a aprendizagem consistirá em “atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade progressiva”.

VITHOR CÉSAR MOREIRA DA SILVA ALMEIDA – Advogado. Especialista em Direito Civil Contemporâneo e em Direito Processual Civil. Assessor Jurídico do Síndico Legal

 

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