Calúnias, injúrias e difamações contra o síndico de condomínio – Um problema constante que tem solução

Calúnias, injúrias e difamações contra o síndico de condomínio - Um problema constante que tem solução

Ser síndico em um condomínio é uma tarefa para poucos e, muitas vezes acaba por trazer percalços desagradáveis, geralmente em decorrência de atritos com os condôminos. Nessas brigas podem imputar ao síndico ou a funcionários do condomínio um determinado crime ou até mesmo ofender a sua honra com palavras de baixo calão ou chacotas.

Pois bem. Muitas pessoas desconhecem os vários crimes que podem aparecer durante um embate com o condômino, bem como não sabem como proceder quando algo desse gênero acontece. Este é justamente o objetivo deste artigo, explicar a diferença dos crimes de calúnia, injúria e difamação e como o síndico ou pessoas ofendidas devem agir caso sejam vítimas de um desses delitos.

 

 

Vamos começar falando da calúnia (artigo 138 do Código Penal), que é um dos crimes mais comuns. Caluniar um indivíduo significa imputar falsamente a alguém um fato definido como crime.  Responde ainda pelo crime a pessoa que passa a informação à diante sabendo que esta é falsa.

Exemplos não faltam.  O mais comum é o caso do condômino ou até do conselheiro que na assembleia ou em uma reunião apontam o dedo para o síndico e falam que este está desviando dinheiro do prédio para sua conta pessoal, ou seja, estão acusando-o de furto.

Outro exemplo seria o condômino que acusa o síndico de estar usando materiais comprados para a reforma do prédio em seu próprio apartamento. Novamente se verifica uma acusação direta de furto.

Lembrando que esse crime não se restringe a fala de uma pessoa, ele também pode ser consumado se escrito. Há casos de condôminos que fazem dossiês e distribuem para as demais pessoas do prédio, imputando crimes específicos ao síndico e funcionários do condomínio ou ainda, como vivemos na era digital, não é incomum fazerem acusações em grupos de WhatsApp ou em comunidades da internet como o Facebook. Todas essas situações são puníveis pela lei, desde que corretamente provadas (falaremos mais sobre isso adiante).

Outro crime contra a honra muito comum é a chamada difamação (artigo 139 do Código Penal) que consiste em imputar fato ofensivo ou desairoso à reputação do indivíduo, perante outras pessoas.  Tutela-se aqui a honra da pessoa em relação à coletividade.

Seguindo o entendimento de GUILHERME DE SOUZA NUCCI, o autor da difamação necessita fazer referência a um fato concreto, que possua uma descrição, como ocasião, pessoas que estariam envolvidas, local, horário. É dizer que não basta um simples insulto para a configuração deste crime.

A título exemplificativo, dizer simplesmente que o síndico do prédio é “caloteiro”, configura o crime de injúria (falaremos mais para a frente). Todavia, espalhar que o síndico do condomínio é caloteiro, pois deixou de pagar a conta de água e luz de um determinado mês, configura o crime de difamação.

A difamação se consuma de forma parecida com a calúnia, ou seja, ocorre quando terceiro toma ciência do fato ofensivo, seja por forma falada ou escrita. Neste sentido é o ensinamento de NUCCI, senão vejamos:

“Consumação: justifica-se a aplicação integral da pena, portanto, considera-se o delito consumado quando a imputação infamante chega ao conhecimento de terceiro, que não a vítima. Basta uma pessoa estranha aos sujeitos ativos e passivos para se consumar a difamação. Se a atribuição de fato negativo for dirigida exclusivamente à vítima, configura-se a injúria, pois a única honra afetada seria a subjetiva”.

Por fim há a injúria (artigo 140 do Código Penal), que significa insultar ou “xingar” uma pessoa. Todavia, para que o crime se consume, não basta à mera ofensa, esta tem que atingir a dignidade (respeitabilidade, amor-próprio) ou o decoro (decência, respeito às normas morais) do indivíduo, a chamada honra interna.

Desta forma já se posicionou o ilustre ministro FELIX FISCHER do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

“Na injúria não se imputa fato determinado, mas se formulam juízos de valor, exteriorizando-se qualidades negativas ou defeitos que importem menoscabo, ultraje ou vilipêndio de alguém.”

A consumação ocorre com o conhecimento da imputação pela vítima. Não existe a necessidade que terceiros saibam.  Deve restar provado que a pessoa tinha a intenção de ofender a outra, de ferir sua honra e imagem.

É o caso do morador do prédio que chama o Síndico de “canalha”, “ladrão” ou “bandido”.

As palavras que são desferidas em tom de crítica ou para corrigir o que a pessoa está fazendo não são necessariamente consideradas injurias. Falar que o síndico ou um funcionário está sendo um inútil por não conseguir realizar determinado serviço soa como crítica, não como uma ofensa a dignidade e decoro deste.

A injúria possui algumas nuances que devem ser ressaltadas.

O artigo 140, incisos I e II trazem hipóteses em que o juiz pode deixar de aplicar a pena de injúria. Seria o caso da provocação reprovável – quando alguém provoca uma pessoa até que esta saia de seu equilíbrio e retruque com outra injúria e, a retorsão imediata – ocorre quando o ofendido devolve a ofensa na mesma hora. Nestes casos não se apena quem injuriou a pessoa.

O texto de lei também traz duas formas qualificadas da injúria.

(1) Quando há vias de fato (envolve violência que não ofende a integridade física da pessoa), estamos falando da chamada injúria real. O exemplo ilustra bem o que é: seria o caso da mulher que dá um leve tapa no rosto do homem durante a discussão ou ainda do individuo que escarra na pessoa quando está sendo ofendendo. A pena aqui é aumentada para 03 meses a um ano e multa.

(2) A chamada injúria racial (a mais grave de todas). Para sua configuração a lei exige que esta injúria seja seguida de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. A pena aqui varia de 1 a 3 anos de reclusão e multa.

Infelizmente este tipo de injúria vem crescendo de forma desarrazoada no Brasil. A lei justamente a pune com mais rigor por ser considerada mais aviltante que os demais tipos que constam no Código Penal.

O artigo 141, inciso III do Código Penal prevê um aumento de pena de 1/3 a todos os crimes que mencionamos, se estes foram realizados na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calunia, da difamação ou da injúria.

O artigo 143  do Código penal traz uma causa extintiva de pena. Caso o agressor (querelado) se retrate (peça desculpas) cabalmente antes da sentença da calunia ou difamação, fica isento de pena.

 

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Passando para o aspecto prático, algumas considerações devem ser feitas para o síndico agir ou qualquer outro condômino e morador caso seja vítima de algum desses crimes:

(a) A vítima- tem o prazo de 6 meses para propor a queixa-crime em face da pessoa que praticou o crime de calúnia, injúria e difamação: A queixa-crime é a peça inicial da ação penal de iniciativa privada (artigo 30 do Código de Processo Penal). Caberá ao ofendido procurar um advogado/representante legal para entrar com essa ação. O artigo 38 do Código Penal impõe o prazo de seis meses para entrar com essa ação, a contar do dia em que vier, a saber, quem é o autor do crime, caso contrário o direito decaí. Muito cuidado! Se passar esse prazo decadência, não se pode mais entrar com a ação.

(b) Caberá ainda, dependendo do caso, uma ação cível de danos morais, tendo em vista todo o sofrimento, angustia e humilhação que a vítima sofreu, gerando prejuízos imateriais e passíveis de reparação, mediante uma condenação pecuniária que será fixada pelo juiz.

Não são raros os casos nos Fóruns em que o ofendido teve que desembolsar uma significativa quantia em espécie para amenizar o sofrimento e todo o abalo moral provocado injustamente à vítima, sendo que a própria condenação, muitas vezes, é uma forma de evitar novos casos de ofensas e também reprimir atos impensados.

Como diz o ditado popular, “o bolso é a parte mais sensível do ser humano”, sendo que uma condenação por danos morais pode até mesmo servir para que o ofensor pense, pelo menos duas vezes, antes de cometer nova agressão ou provocação contra a vítima.

Para melhor ilustrar, colacionamos abaixo jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o assunto:

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Pretensão indenizatória deduzida pelo autor contra a ré, em virtude de ofensa praticada em assembleia condominial, na qual ele figurava como síndico. Sentença de parcial procedência, condenado a ré a indenizar o autor em R$ 4.000,00, a título de danos morais. Apela a ré, alegando ser o autor litigante de má-fé; ausência de afronta a qualquer atributo do autor a ensejar responsabilidade civil por danos morais. Descabimento. A ré ofendeu o autor em assembleia condominial, asseverando que o sindico rouba o condomínio, justificando a indenização de R$ 4.000,00. Não se evidencia conduta capaz de abonar a ofensa perpetrada pela ré. Recurso improvido”.

(c) Funcionários do condomínio como porteiros e faxineiros também podem ser vítimas desses crimes. Entendemos que nessa situação o síndico deva interferir no caso e auxiliar os funcionários que foram vítimas, dando a estes o aconselhamento jurídico necessário, bem como os meios para processar os agressores.

(d) É de suma importância à produção de provas para comprovar a ocorrência dos fatos. Caso sejam realizados em prédios, procurar por filmagens (de preferencia com áudio) e testemunhas que presenciaram a ocorrência – outros moradores ou funcionários do prédio. Escrever no livro de reclamação do prédio, narrando de forma pormenorizada os acontecimentos, também serve como prova.

(e) Caso as ofensas sejam realizadas por meio digital (Facebook, Whatsapp e outros), é interessante levar o celular ou computador em cartório e fazer uma ata notarial. A ata irá descrever todas as ofensas que estão na tela (ou então um print da tela será colocado na ata) com o intuito de dar legitimidade e fé pública a essas imagens, garantindo que no processo ninguém lhe acusará de ter adulterado a prova.

(d) Caso não seja possível fazer a ata notarial, imprima todo conteúdo e converse com seu advogado ou autoridade policial as melhores formas de usar essas provas.

(e) Finalizando o artigo, se as ofensas ocorrerem durante uma assembleia, peça para o responsável consignar o ato em ata. Também é licito você gravar ou filmar a pessoa praticando o ato.

Muitas das vezes os casos de tumultos em assembleias vão parar na Delegacia de Polícia, podendo configurar, além dos crimes já mencionados, a contravenção penal de provocação de tumulto, devido ao fato do indivíduo se portar- de modo inconveniente ou desrespeitoso em local solene, senão vejamos, in verbis:

Lei das Contravenções Penais – Decreto Lei nº 3.688 de 03 de Outubro de 1941 – Art. 40. Provocar tumulto ou portar-se de modo inconveniente ou desrespeitoso, em solenidade ou ato oficial, em assembléia ou espetáculo público, se o fato não constitue infração penal mais grave; Pena – prisão simples, de quinze dias a seis meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.

Acrescentamos que no caso específico dos síndicos, além dos subsíndicos, conselheiros ou até os funcionários que prestam serviços aos Condomínios, todas às despesas com uma demanda judicial, inclusive, os honorários gerados com a contratação de advogado particular, podem ser arcadas pelo próprio Condomínio.

Até porque, não é justo que o sindico, por exemplo, seja ofendido na sua função e ainda tenha que pagar do seu próprio bolso para defender os seus direitos na Justiça, onerando ainda mais a sua situação financeira.

O causador do dano deverá responder pela “integralidade” dos prejuízos causados à vítima. Trata-se do princípio da reparação integral, devendo ressarcir à vítima de todos os prejuízos financeiros experimentados, o que inclui os honorários dispendidos com a contratação de profissionais. Veja:

Art. 389, Código Civil. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Art. 404, Código Civil. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

 

 

O princípio da restituição integral, inclusive, é consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça, veja a ementa abaixo:

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VALORES DESPENDIDOS A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. 1. Aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte com os honorários contratuais, que integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02. 2. Recurso especial a que se nega provimento” (3ª Turma, REsp nº 1.134.725/MG, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, j.14/6/2011).  Grifamos.

Essas são algumas das soluções juridicamente autorizadas pela Legislação Brasileira às pessoas que sofrem qualquer um desses atos de calúnia, difamação ou injúria, recomendando sempre a consulta de um advogado para às providencias necessárias.

Afinal, quem comete um ato ilícito (cível ou criminal) contra o sindico ou qualquer outro prestador de serviços do Condomínio que foi injustamente ofendido, não pode ficar simplesmente impune.

Todas essas medidas jurídicas servem até mesmo como forma de “dar o exemplo” aos demais condôminos ou pessoas que não tenha a decência de respeitar – ainda que não concorde – com o trabalho legítimo do sindico e, acima de tudo, respeitar a sua dignidade!

Fábio Paiva Gerdulo, advogado criminalista. Sócio-fundador do escritório de advocacia Fábio Paiva Gerdulo. Alexandre Callé, advogado civilista e especializado em condomínios. Sócio-fundador do escritório Advocacia Callé.

 

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