A Perturbação do sossego nos Condomínios. O que fazer?

Os incômodos dos diversos barulhos, ruídos, aparelhos de sons, festas que ocorrem nos condomínios.

Nos dias atuais muitas pessoas moram em condomínios fechados, isso ocorre pela segurança que os condomínios oferecem, dentre outros fatores que possibilitam aos pais deixarem seus filhos brincar pelo local sem grandes preocupações. Até porque, na maioria dos casos, os condomínios contam com portaria, guarda, câmeras de vigilância e etc. Tudo isso colabora para que os moradores durmam no conforto do seu apartamento com mais tranquilidade durante à noite.

A expressão “condomínio” expressa comunhão de direitos e deveres entre duas ou mais pessoas sobre um bem ou um conjunto de bens. Assim, a propriedade é exercida em comum em quotas ou frações ideais.

Assim, nos condomínios temos alguns pontos positivos tais como: a segurança, tranquilidade, espaços mais amplos, menos barulho e etc. Por outro lado, temos também os pontos negativos, tendo como o principal vilão os barulhos, ruídos, aparelhos de sons, festas e etc., o que tem “tirado o sono” de muitos condôminos.

Qual o condômino nunca passou por isso? Seja pelas crianças brincando no playground, jogos nas quadras poliesportivas, festas nas churrasqueiras e/ou espaços gourmet, regado a muita bagunça, música e gritaria.. Na maioria dos casos, as festas nas churrasqueiras e/ou espaço gourmet são os campeões de reclamações nos condomínios.

Diante disso, existem limitações ao direito de propriedade como por exemplo, o direito de vizinhança. O art. 1.277 do Código Civil prevê que o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha“.

Os atos prejudiciais à propriedade podem ser ilegais, quando configurar ato ilícito; abusivos, aqueles que causam incômodo ao vizinho, mas estão nos limites da propriedade (barulho excessivo, por exemplo).

O QUE FAZER QUANDO ISSO OCORRE?

Inicialmente, os condôminos devem comunicar a portaria para que acionem o zelador ou sindico (a), para que o mesmo possa verificar in loco o ocorrido. Assim, em caso de procedência das reclamações, o zelador ou sindico (a) conversará com o condômino para que o mesmo abaixe o som, diminua os ruídos e/ou barulhos e etc.

 

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Assim, persistindo as reclamações dos condôminos, o condômino (chamaremos de condômino “sem noção”) será notificado formalmentepara que faça menos bagunça, barulho e/ou abaixe o som, pois havendo nova reclamação, o mesmo será multado (o valor da multa depende do que está previsto na convenção ou Regimento interno, mas normalmente é o valor de uma contribuição do condomínio, não podendo ser maior que cinco contribuições, conforme dispõe o Código Civil).

Mesmo após ser notificado formalmente, o condômino “sem noção” continua com a bagunça e a música alta e, surgem novas reclamações dos demais condôminos, então, o condômino “sem noção” deverá será multado pelo sindico (a).

Após ser multado, o condômino “sem noção” continua com a festa, o som alto e demais ruídos que causam incômodos aos demais condomínios.

E Agora?

Sendo assim, verificaremos o que diz a legislação a respeito do tema.

DISPOSIÇÕES LEGAIS

Veja-se o que diz o Código Civil sobre o tema, em seu art. 1.336in verbis:

Art. 1.336. São deveres do condômino:

(…) omissis

IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

(…) omissis

§ 2º – O condômino, que não cumprir qualquer dos deveres estabelecidos nos incisos II a IV, pagará a multa prevista no ato constitutivo ou na convenção, não podendo ela ser superior a cinco vezes o valor de suas contribuições mensais, independentemente das perdas e danos que se apurarem; não havendo disposição expressa, caberá à assembléia geral, por dois terços no mínimo dos condôminos restantes, deliberar sobre a cobrança da multa.

Em Cuiabá, capital de Mato Grosso, a Lei nº 3819/1999 dispõe sobre padrões de emissão de ruídos, vibrações e outros condicionantes ambientais e dá outras providências.

Ainda, a Lei 9.605/98, trata das sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente e, em casos excepcionais, a depender nível de ruídos emitidos, se capazes de causarem alterações substanciais na saúde humana ou no meio ambiente, haverá o crime de poluição, previsto em seu art. 54caput, assim redigido:

Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Quanto à poluição sonora, o STF já reconheceu que ela configura delito ambiental, inclusive com possibilidade de prova meramente testemunhal para comprovação da materialidade delitiva.

Nesse sentido:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. POLUIÇÃO SONORA.AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSUBSISTÊNCIA. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. I – Nulidade da sentença condenatória em virtude da não realização da prova pericial visando à comprovação da prática de crime ambiental (poluição sonora). II – Alegação insubsistente, pois, conforme assentou o acórdão impugnado, a materialidade do delito foi comprovada pela prova testemunhal. III – Esse entendimento vai ao encontro de jurisprudência consolidada desta Corte no sentido de que ‘embora a produção da prova técnica seja necessária para esclarecer situações de dúvida objetiva acerca da existência da infração penal, o seu afastamento é sistemático e teleologicamente autorizado pela legislação processual nos casos em que há nos autos outros elementos idôneos aptos a comprovar a materialidade do delito’ (HC 108.463/MG, Rel. Min. Teori Zavascki). IV – Recurso ordinário não provido’ (STF, RHC 117465/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 18.02.2014)” [Crimes Ambientais: comentários à Lei nº 605/98, 2. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015, p. 227].

Por outro lado, há também a contravenção penal de “Perturbação do sossego”, Decreto-Lei nº 3.688 de 03 de outubro de 1941, no capítulo das infrações referentes à Paz Pública, em seu artigo 42in verbis:

Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheios:

I – com gritaria ou algazarra;

(…)

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa.

Deste modo, após tentar os meios “amigáveis” para solução da avença, os condomínios, o zelador e/ou o sindico devem acionar a polícia para que façam a intervenção na festança do condômino “sem noção” e, se for o caso, façam o boletim de ocorrências.

Vale frisar que a “Perturbação do sossego” não se trata de Crime, mas de contravenção penal, é ação penal pública incondicionada e, não precisa ter uma vítima específica, sendo desnecessária a manifestação expressa de possível ofendido, pois o que a lei protege é o interesse e os direitos da coletividade.

Para caracterizar a contravenção penal de perturbação do sossego alheio (art. 42LCP), é necessário que alguém perturbe o trabalho ou o sossego alheios a) com gritaria (berros, brados) ou algazarra (barulheira), b) exercendo profissão incômoda ou ruidosa em desacordo com as prescrições legais, c) abusando de instrumentos sonoros (equipamentos de som mecânico ou não) ou sinais acústicos, ou d) provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal que tem a guarda.

Veja-se que a expressão” sossego “não está tutelando apenas o descanso ou repouso, mas também o direito à tranquilidade das pessoas. Ninguém é obrigado a suportar barulho excessivo e ininterrupto provocado por vizinhos, apenas porque o som é provocado antes do horário de repouso. Em outras palavras, a contravenção pode ocorrer também durante o dia.

A expressão alheios indica que a perturbação do trabalho ou do sossego de uma única pessoa não configura a contravenção. Tanto a doutrina como a jurisprudência, entendem que a perturbação do sossego alheio não se configura pela ocorrência de qualquer ruído, mesmo que de intensa sonorização, se não vier a atingir a generalidade das pessoas de determinado local.

Nesse sentido veja-se o seguintes excerto de julgado, in verbis:

APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME DO ART. 42 DA LEI DAS CONTRAVENCOES PENAIS – PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO – PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE – REJEITADA – MÉRITO – ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE DA CONDUTA – RECURSO PROVIDO. A configuração da perturbação do sossego está condicionada a premissa da existência de uma multiplicidade de vítimas, e no caso em análise, não houve prova que apontasse a perturbação do sossego de mais pessoas. (TJ-MS – APL: 00042919620158120005 MS 0004291-96.2015.8.12.0005, Relator: Des. Manoel Mendes Carli, Data de Julgamento: 21/02/2017, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 20/03/2017)

O barulho, no entanto, deve ser diverso da normalidade (data festiva – carnaval, ano, etc.). Caracterizado o barulho excessivo, é possível, portanto, requerer, na esfera criminal, administrativa e/ou cível, a sua cessação como também a indenização por eventuais danos sofridos.

Consigne-se que o barulho não pode ser qualquer um. Deve ultrapassar o mero aborrecimento, do homem médio, por isso, excessivo. Deve ser uma circunstância anormal que, diante da gravidade do ilícito, venha causar incômodo às pessoas próximas (vizinhos/moradores, visitantes, trabalhadores, etc.) do local.

Destarte, os condôminos lesados, poderão buscar reparação de danos na esfera cível. A prova do barulho excessivo, pode ser feita por testemunhas, provas documentais (gravações de vídeos ou áudios e boletins de ocorrência), e outros meios de prova (conforme CPC), admitindo-se, inclusive, a inversão do ônus da prova, quando cabível.

Neste sentido, julgado do e. TJMT, in verbis:

AGRAVO INTERNO – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DANO MORAL COM PEDIDO LIMINAR – DIREITO DE VIZINHANÇA – PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO – SOM ALTO – OBJETOS JOGADOS SOBRE O TELHADO COM APARÊNCIA DE MACUMBA – AMEAÇA – AÇÃO NEGATIVA REITERADA PROVADA POR FOTOS, BOLETINS DE OCORRÊNCIA E RECLAMAÇÕES PERANTE JUIZADOS ESPECIAIS – DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTUM RAZOÁVEL – DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA – RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE – APLICAÇÃO DE MULTA DE 3% SOBRE O VALOR DA CAUSA – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO.

1 – Se há nos autos provas capazes de demonstrar a verdade do alegado, de rigor reconhecer a ocorrência de ofensa íntima a ensejar o correspondente dever de reparação.

2 – Na hipótese, as mesmas situações relatadas pela Agravada foram vivenciadas por anterior inquilina do imóvel, tendo ambas registrado de diversos modos atitudes hostis e desrespeitosas por parte de seu vizinho, o Agravante.

3 – Preenchidos os elementos caracterizadores do dano moral, foi este reconhecido, motivando a fixação de indenização em valor que se mostra razoável.

(…)

(Ag 90771/2017, DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 22/11/2017, Publicado no DJE 27/11/2017)

Portanto, em breve síntese a respeito do direito ao sossego e suas consequências jurídicas, de forma singular a existência do direito ao sossego, decorrente do direito da propriedade, direito à saúde, à vida e à paz e suas implicações no campo administrativo, cível e criminal.


Rogério Antunes dos Santos, advogado atuante no Estado de Mato Grosso. Sócio Proprietário do Escritório Rogério Santos Advocacia. Membro da comissão de direito condominial da OAB/MT. Especialista em Direito condominial.

 

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Fonte: Jus Brasil